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31.5.07

FRASE DO DIA


"Fósseis de mamíferos primitivos regressam para os portugueses."

Teresa Firmino - "Público" - 31/5/2007

***

... e em que municípios se vão candidatar a presidentes?

PENSAMENTO DO DIA



O absurdo dos radicalistas em matéria de tabaco fica evidente diante da seguinte hipótese: se eu quiser abrir um restaurante destinado apenas a fumadores, não posso. Primeiro poruqe não podia impedir a entrada de um não fumador e, depois, porque estando dentro do restaurante, esse não fumador poderia impedir todos os outros frequentadores de fumarem.

Isto é, o que pretendem mesmo é proibir o tabaco. Mas não têm coragem para o fazer.

PERGUNTAS SEM RESPOSTA



A fraca adesão à greve geral (e serem escassos os salários que não vai pagar) foi um rude golpe nos esforços do Governo para reequilibrar o Orçamento Geral do Estado?

A GREVE GERAL



VERSÃO DO GOVERNO:




- Em Olaios, a repartição de finanças esteve aberta ao públçico e recuperaram-se 580 euros de impostos atrasados;

- Em Faia, no Alentejo, não houve greve no posto de assistência médica permanente porque foi encerrada a semana passada;

- Em Lisboa, trabalharam todos os Ministros, Secretários de Estado, Chefes de Gabinete, secretárias e motoristas; fizeram greve as mulheres da limpeza;

- Em Favaios, a GNR desempenhou as suas funções habituais; só houve o roube de uma motorizada, mas a guarda já está no encalce do ladrão;

CONCLUSÃO: A greve geral não passou de uma anedota.





VERSÃO DA INTERSINDICAL:



- Em São Paio de Oleiros, todos os trabalhadores agrícolas da expliração do senhor Joaquim faltaram ao trabalho; só trabalhou o dito, a mulher e a filha, mas esses são o patronato;

- Deixem-me falar por favor!

- O minimercado do senhor Carvalho, em Viana do Castelo não abriu;

- Deixem-me falar, por favor!

- As Câmaras municipais só não estiveram fechadas porque o Sindicato dos Porteiros e Afins é da UGT.

- Deixem-me falar, por favor!

CONCLUSÃO: A greve geral foi uma grandiosa manifestação dos trabalhadores em todo o país e um sério aviso à navegaçao! As percentagens aparecerão no Relatório Anual da Intersindical. De que ano, ainda não sei.

A DUVIDA - 83º. fascículo

(continuação)

XV

Quartier Portugal era um nome pomposo demais para aquele amontoado de barracas de madeira e lata, pedaços de espuma de borracha sintética a fingir de vedação das frinchas enormes. Humildemente, o bairro de lata escondia-se num pequeno vale, duas colinas a servirem de púdicos cortinados de pobres envergonhados. Ao longe, divisavam-se os enormes caixotes da habitação social, reservada aos operários franceses e a alguns emigrantes mais sensíveis às pequenas comodidades, proporcionadas por sessenta metros quadrados de chão de madeira e coberto. Conforto desmedido, quando comparado com o revestimento de cartão canelado do chão das barracas. Na maior parte dos cubículos, viviam apenas homens, aos três e quatro por cada.

Era domingo. De manhã. Apanhei muitos em casa. Alguns entretidos na confecção do almoço, numa portuguesíssima máquina a petróleo, barulhenta e encardida. Falei com muitos. Dum modo geral todos tinham trabalho e ganhavam o que, comparado com os salários "de lá", eram autênticas fortunas. Na sua maior parte, enviadas religiosamente para casa, em cada fim de mês. Antes do dia cinco. O banco demorava uns três dias para fazer a transferência e convinha o dinheiro chegar à conta antes do senhorio bater à porta. Tomei nota para ir ao banco, mal chegasse a Portugal, perguntar se pagavam juros por esses três dias de dinheiro retido. Apenas um, o Figueira, encontrara modo de se não ralar muito. Também não tinha deixado família a sustentar, lá. Lá e cá eram advérbios de existência permanente naquelas bocas. O pai já morrera e as duas irmãs sustentavam a mãe. Lá. Ele, o Figueira, só tinha que se desenrascar. Cá. Seis dias depois de ter arranjado trabalho, cá, dera baixa por doença; e, desde há quatro anos, estava por conta da Sociale de cá. Não precisava enriquecer, porque não tencionava voltar para lá. O decurso, não muito extenso, entre o levantar e o deitar, escoava-se, ao ritmo dos cálices de pastis, no bistrot da alentada madame Francine. Houve mesmo maldizentes a segredarem-me, com ar malandro, que a madame trocava, ela por ela, o pastis e extensas noites de fantasias eróticas, nas quais o Figueira seria mestre.

(continua)
Magalhães Pinto

SORRISO DO DIA

A principal diferença entre a Europa e os Estados Unidos...



(Imagem de jokefrog.com)

30.5.07

SUGESTÃO TURÍSTICA

FLORENÇA (Itália)


Capital da Tuscânia, situada a meio caminho entre Génova e Roma, Florença é uma cidade imprescidível no currículo de viagens dois amantes da Cultura e da Arte.



Ali, diz-se, começou o Renascimento. Sob a protecção dos Médicis, nenhum artista era considerado grande sem ter feito obra e estudado em Florença.



Como disse um dia um turista de Florença, "é uma cidade onde a cada pontapé que se dá numa pedra, surge-nos um Da Vinci ou um Miguel Ângelo".



Com uma população sensivelmente igual à da cidade do Porto, em Portugal, constituída por gente afável e acolhedora, Florença, junto com as vizinhas cidades de Siena e Pisa, enche bem um programa de uma semana.



Com facilidade se pode dar um salto a Roma, recomendando-se o uso do combói para essa deslocação.



Um orçamento da ordem dos 700,00 euros por pessoa deve chegar para a viagem, com alojamento duplo em hotel de quatro estrelas.



Gentileza de Viagens 747

PENSAMENTO DO DIA


As boas almas, que tanto se insurgiram contra as ditaduras de Pinochet (Chile) e Videla (Argentina), estão silenciosas que nem ratos perante os desmandos de Hugo Chavez (Venezuela). A Esquerda não tem vergonha, não tem consciência, não tem um pingo de dignidade. É tão boa como as três figuras citadas.

(Imagem de idelberavelar.com)

FRASE DO DIA


"Comissão propõe fecho de três hospitais psiquiátricos."

Catarina Gomes - "Público" - 30/5/2007

***

Depois queixem-se que "eles" andam por aí à solta e que até vão alguns para o Governo...

PERGUNTAS SEM RESPOSTA


Se só há um camelo ao sul do Tejo, quantos haverá em Portugal inteiro?... Só?...

(Imagem de eueosoutroseus.zip.net)

A DUVIDA - 82º. fascículo

(continuação)

Só mais tarde, viria a ganhar significado para mim o teu comportamento do resto da noite, Maria do Céu. O modo fugidio como te despediste do Miguel, a deixares correr os teus dedos na mão dele, num cumprimento fugaz, como se ela estivesse em brasa. A tua fuga hotel adentro, sem mesmo esperares por mim. O modo célere como, no quarto já, te desembaraçaste do vestuário. Os monossílabos de resposta aos meus comentários sobre o serão. Como simuláste adormecer rapidamente, voltando-me as costas e não respondendo às carícias que, com a mão direita, fiz nos teus seios. Como abruptamente e com o calcanhar, me empurraste as coxas, quando o meu sexo erecto procurou encontrar abrigo nas tuas nádegas. Era como se, de repente, a antiga frigidez voltasse a fazer parte de ti. Senti frio, também. Mas recusei-me a aceitar a ideia. Nada se passara, a justificar uma mudança tão abrupta. Fiquei longo tempo acordado, olhos fixos na escuridão, virando-te e revirando-te em todas as direcções. Parecia um oleiro a ver girar, diante de si, a infusa de barro mole, tentando moldá-la com as carícias dos seus dedos, e que, de repente, dá por que o barro secou, ainda disforme, sem ter conseguido acabar a obra. Insisti. Apetecia-me dar um murro na vasilha, estilhaçando-a, para recomeçar. Procurei desesperadamente uma explicação. Debalde. De certeza apenas tive, nessa noite, que tu também não dormiste, Maria do Céu. Ou, se dormiste, foi um sono muito perturbado. A tua respiração irregular não enganava.

(continua)

A. Magalhães Pinto

SORRISO DO DIA

Apesar da chuva torrencial, o estádio estava cheio. O que me faz presumir que foi um jogo contra o Benfica...



(Imagem de jokefrog.com)

29.5.07

CRONICA DA SEMANA


Há longos anos, mais propriamente pelos inícios da década de noventa, desenrolava-se, no BCP, uma luta sem quartel. De um lado, Américo Amorim, detentor de 20% do capital do Banco, seu accionista principal. Do outro lado, o gestor competente que os promotores do Banco tinham ido buscar ao BPA, Jorge Jardim Gonçalves, engenheiro, então presidente do BPA a convite de Mário Soares. Recordo esses momentos com a citação do conteúdo do meu livro "A OPA", editado pela Vida Económica, sobre o tema:

"A fim de ter as mãos livres para realizar o plano expansionista traçado, Jardim tem que reduzir a força accionista de Américo Amorim. E inicia o processo de blindagem dos estatutos, reduzindo o poder máximo de qualquer participação a 10% dos votos. Apoiado nas procurações de uma imensa legião de pequenos accionistas e com o apoio dos accionistas institucionais mais pequenos, Jardim sai vencedor da batalha. O processo determinaria, inclusivamente, o afastamento do Banco Popular Espanhol, accionista da primeira hora, alegadamente descontente por Amorim ter sido tratado ‘como nenhum accionista com apenas dois por cento teria sido tratado em qualquer banco europeu, quanto mais com vinte’.

Concluída a blindagem, Amorim já está disposto a sair. Mas só em Março de 1993 a oportunidade se apresentará. Pacientemente, Amorim teceu a teia de representações que, mesmo com os estatutos blindados, lhe pode permitir a detenção duma maioria. Gasta cento e cinquenta mil contos na contratação de advogados que lhe consigam as procurações de votantes detentores de ADR’s. E consegue-as. Na posse dessas procurações, avança para a Assembleia Geral Ordinária. Antes da Assembleia Geral, apresenta um ultimato a Jardim. Ou este lhe adquiria a posição ou iam ter Assembleia até às calendas. Com todos os reflexos negativos que tal podia ter nas cotações dos ADR’s em Nova Iorque.. Podia mesmo acontecer que aqueles fossem retirados da cotação.

No próprio dia da Assembleia, e antes desta ter início, Jardim assusta-se. Pela listagem de presenças asseguradas, apercebe-se que Amorim detem a maioria do capital votante, embora este não saiba. Tem, uma longa conversa com ele. Procura mostrar-se frio e seguro. Amorim não sabe que tem a maioria. E concede um prazo a Jardim para encontrar comprador para a sua posição. Jardim vai respeitar esse prazo, embora à custa da admissão de uma instituição que ele não desejaria ver no BCP: o Banco Central Hispano-Americano.".

Correu o tempo. Pelo meio ficaram operações concluídas com sucesso – o caso da OPA sobre o BPA, por exemplo, e de insucesso, os casos das operações na Polónia e no México, por exemplo. O Banco cresce até se tornar na maior instituição financeira privada de Portugal. Até que chegamos a 2007, o ano da desgraça. Tudo começa com a tentativa de tomada de assalto do BPI. Falhada. Inclusivamente de um modo humilhante. O BCP não conseque comprar sequer quatro por cento do capital do Banco visado. Jardim Gonçalves, entretanto saído da direcção executiva do banco para o Conselho Superior - o qual tem funções meramente consultivas - tem novo susto. Por um lado, o Banco fica vulnerável a ofensivas alheias e, por outro, os responsáveis do Banco ficam na mira dos accionistas. Decide, então, avançar com propostas que visam vários objectivos

- aumentar a blindagem dos estatutos, para impedir agressões alheias;

- retirar dos accionistas o poder de designar a direcção do Banco, colocando-a nas suas mãos;

- ter o direito de assistir as reuniões da direcção superior, o que, naturalmente, não seria só para passar tempo a ver o que se corria.

Surge como muito evidente que Jardim Gonçalves pretendia, sobretudo, recuperar o poder de que já dispusera, neutralizando, atrevés de manobras burocráticas, os accionistas, tal como já fizera, nos anos noventa, com Américo Amorim.

Só que os ventos não correram de feição. Os tempos já não eram os mesmos e os accionistas eram outros. E a Jardim Gonçalves estava reservado, como resposta a esta sua manobra, uma atitude esmagadora e que só não foi humilhante porque, como costuma suceder nestas coisas, até nos plenários de trabalhadores, a sua proposta foi retirada da discussão antes de ser votada. Tudo isto não sem, antes, ter que ouvir frases extremamente contundentes provenientes dos accionistas. Foi Joe Berardo o porta-voz mais audível do que pensava uma boa parte dos bastidores. Recordo duas frases com particular vexame:

- "O Banco não é a Igreja Católica, que quando nomeia um Papa é para toda a vida";

- "Se quiser que o Banco seja seu, que faça uma OPA".

Não sou um especialista sobre o currículo de Joe Berardo. Sei que foi um emigrante muito jovem, para o Canadá, que lá fez fortuna, que tem sabido multiplicá-la e que, ao contrário de muitos outros, tem vindo a investi-la no seu país. Mas é um homem de raiz muito diferente da de Jardim Gonçalves. O que ele disse a Jardim Gonçalves, se retirarmos os ornamentos das frases, foi, pura e duramente, o seguinte: "Rua!".

Profunda ironia. Jardim Gonçalves foi um dos maiores "desempregadores" do país. Basta recordar o que aconteceu no BPA. Apesar de ter afirmado, no documento em que lançava a OPA sobre essa instituição, que não estava prevista a perda de postos de trabalho no seguimento da OPA, a verdade é que, menos de dois anos depois, algo que se afirma ser mais de noventa por cento dos quadros do BPA tinham desaparecido das suas funções. Jardim foi também um dos maiores predadores de instituições existentes na nossa economia. Chegou o momento em que alguém repete para ele o gesto que, a seu mando, foi mostrado a tantas pessoas. O dedo apontado para a porta.

Mesmo para quem não morre de simpatias pelo homem, como eu, é triste. Seja como seja, tem uma obra para mostrar. Redundou essa obra sobretudo, em benefício seu e dos seus apaniguados? Não sei. Mas a obra está aí. E é triste ver que alguém, com algum valor e inteligente, não consegue discernir quando é o momento de se afastar. Recordo as palavras de outro homem que muito apreciei, Daniel Pina Cabral, meu co-administrador de algumas empresas do Grupo BPA, quando, em resposta à minha estranheza por desejar aposentar-se quando ainda estava muito capaz de dar a sua colaboração profissional, me disse:

- Quero ir-me embora enquanto me querem cá; porque não há nada mais triste do que estar cá quando nos querem mandar embora.

Jardim Gonçalves não soube sair. Acontece muitas vezes com homens a quem o poder obnubila. Demasiado poder faz perder a visão relativa das coisas. E faz, essencialmente, perder de vista a realidade de que a glória é sempre vã e transitória.

Crónica RUA! - Magalhaes Pinto - "Vida Económica" - 31/5/2007

(Imagem de mocho.weblog.com)

PERGUNTAS SEM RESPOSTA


Haverá alguma relação entre o facto de trabalharmos 150 dias para pagar impostos ao Estado e o Estado pagar as suas dívidas só ao fim de 150 dias em termos médios?

FRASE DO DIA


"O Banco não é a Igreja Católica, que nomeia um Papa para toda a vida!"

Joe Berardo na AG do BCP - "Público" - 29/5/2007

***

Contundente e directo... Este Joe parece um cowboy agnóstico!... Com um erro. Quem nomeia pessoas como Jardim Gonçalves é Monsenhor José Maria Escrivá, beato pela vontade de Deus...

PENSAMENTO DO DIA


Ironias do destino. Jorge Jardim Gonçalves, Presidente do Conselho Superior do Millenium/BCP, provavelmente um dos maiores "desempregadores" do país, sente agora a tristeza de ver alguém apontar-lhe o dedo para a porta e dizer-lhe: "Rua!".

A DUVIDA - 81º, fascículo

(continuação)

Só tinha ido pela Ana quase cinco anos depois. Olhou-a com ternura e pegou-lhe na mão. Uma boa mulher esta minha Ana. Esperou por mim aquele tempo todo. Se calhar porque nem sonhara que aquela Solange, lá de Lille, lhe tinha posto a cabeça à roda. Mas, quando foi por ela, já estava em Paris, para onde saltara na esperança de encontrar trabalho no batiment, sabe como é, os franceses não gostam de alombar com celhas de cal à cabeça. Começara a trabalhar de trolha, mas rapidamente se apercebeu de que melhor governo teria com uns biscates por conta própria. Começara sózinho. A demanda era muita, porém. Por isso, fora buscar outros portugueses para o ajudarem. E resolvera regularizar a sua situação de empresário nascente, porque os clientes lhe pediam facturas e recibos e tudo isso. Assim começara a sua empresa. Fora à terra ao fim de cinco anos, nas vacanças, e fizera já um casamento de arromba. E trouxera a Ana com ele. Voltar, regressar de vez, era sempre uma possibilidade, iam lá sempre nas férias, mas era uma hipótese cada vez mais longínqua. Tá ver, com o Jacques e o François já adiantados na école française, era matar-lhes o futuro se eu e a minha Ana decidíssemos ir embora...

Eram quase duas horas da madrugada quando deixamos o Caveau des Oubliettes. Não sem antes uma das empregadas de mesa nos ter ido mostrar um pequeno museu contíguo, onde estavam expostos os instrumentos de tortura, usados pelos esbirros de Luís XIV no interrogatório dos infelizes caídos naquelas celas. Nas quais apodreciam, se não tinham a sorte de sucumbir ao suplício. Esquecidos. Insignificantes oubliettes das grandes questões de estado.

O ar fresco e seco da noite cortou-nos as faces. Apressamos as despedidas. Como o Miguel ia para os lados do hotel, foi ele que nos levou no seu Renault, duzentos mil quilómetros já rodados comprados nas occasion por dez reis de mel coado.

(continua)

Magalhães Pinto

SORRISO DO DIA

Secagem na corda...

28.5.07

PERGUNTAS SEM RESPOSTA


Quando é que chegaremos à fase que, na Primeira República, deu origem aos Governos de Salvação Nacional?

SORRISO DO DIA

Cão-polícia especializado na busca de droga...

A DUVIDA - 80º. fascículo

(continuação)

O Miguel Tesoureiro tinha tanto de belo como de calado. Quase não abriu boca durante todo o serão. Nem mesmo quando, aproveitando um intervalo da cantoria, procurei saber como ia a vida da associação. Parecia ausente, a passear constantemente o indicador direito por sobre a borda do copo de beaujolais, olhos fixos na mesa de madeira tosca. Mudei o rumo da conversa e quiz saber de onde era, como tinha vindo parar a França, a sua ocupação, se pensava regressar. Não tive maior êxito. Vagamente, fiquei a saber que, apurado nas sortes, se tinha escapulido antes da incorporação, a salto, fugindo à guerra. Passara um mau bocado. Até fome. Era melhor nem falar nisso. Acabei por eleger por interlocutor o casal de Finzes.

O Manuel de Finzes estava em França há quase vinte anos. Legalmente, que há vinte anos ninguém vinha a salto. Ainda o cheiro da guerra se misturava com o dos pinheiros da Flandres. A carta de chamada viera por um tio solteiro, aventureiro, cujas relações do comércio negro do tempo da guerra - havia mesmo quem dissesse ter servido de correio para assuntos mais secretos - lhe tinham facilitado a domiciliação no imediato pós-guerra. Insatisfeito com a vida de servente agrícola, na quinta do morgado lá da terra, tinha abalado cedo para Lisboa, à procura de melhor sorte. Por lá fizera um pouco de tudo. Acabara a vegetar na construção civil, que maior satisfação lhe não dava. Tentara emigrar para Angola. A propaganda da exposição colonial tinha-lhe aguçado os anseios de enriquecimento. Correra seca e meca para juntar os papéis necessários, sabe lá como era marrante! Nunca cheguei a entender, naquele tempo, se Angola era ou não era Portugal, também. Foi precisa a guerra para sabermos que aquilo é nosso. Cheguei a pensar emigrar para a Venezuela. Era mais fácil. Mas a carta salvadora do tio, a oferecer-lhe o emprego, chegara no momento certo. Fora à terra, despedir-se dos pais e dos seis irmãos e prometer à Ana que viria daí a uns dois anos buscá-la. E metera-se no combóio, para uma viagem de quase três dias, com mudança em Paris. Sem saber uma palavra de patois, só queria que visse! Aconteceu-me uma boa aqui em Paris, onde comi, num restaurante da Gare du Nord, ainda me lembro da cara palerma do garçon! Não quiz dar parte de fraco, quando ele me apresentou a carte. Eheh!... Sabia lá eu o que era vianda nessa altura! Olhe, fui apontando a dedo o que queria manjar. O tipo ainda hoje deve estar a pensar que eu era mudo! Eheh!... O riso fazia brilhar ainda mais, naquela meia obscuridade, os dois olhos pequenos mas muito vivos. Começara a ficar assustado quando viu colocarem-lhe à frente pratos e mais partos, uns vazios, outros com molhos. No fim, tinha comido amêijoas cozinhadas de três modos diferentes. Embrulhara a fome no orgulho lusitano salvaguardado e quase ficara sem a meia dúzia de francos trazidos para a viagem.

(continua)
Magalhães Pinto

PENSAMENTO DO DIA


Em Espanha, o Partido Popular conseguiu, nas eleições autárquicas, o melhor resultado de sempre, inclusivamente melhor do que o obtido em 1995, que prenunciou a vitória de Aznar no ano seguinte- O efeito emocional do 11-M esvaiu-se nas tropelias de um Zapatero. Este já foi. Todos vão. Em qualquer parte do Mundo...

FRASE DO DIA


"As injúrias à mãe da autoridade - e cada autoridade tem uma mãe - são um capítulo não escrito, mas crucial, no exercício do poder em Portugal."

Helena Matos - "Público" - 28/5/52

***

... e quanto maior a autoridade, maior a mãe...

27.5.07

A DUVIDA - 79º. fascículo

(continuação)

XIV

Deixei-me embalar naquela voz rouca, quente, com tonalidades de brisa rasante a sussurar no restolho. Recordava vagamente a de George Brassens. Os seus dedos percorriam as cordas do violão, com a diligência das formigas em dia soalheiro. As notas graves esvoaçavam na penumbra, contorciam-se vagarosamente na abóbada granítica da sala e vinham pousar suavemente nos meus ouvidos. Os poemas satíricos, contestatários, de Villon ganhavam uma doçura particular, naquele cenário e com aquela voz. A combinação era perfeita. Nada como uma antiga prisão para evocar o canto, meio sofrido, meio reivindicativo, dos desprotegidos medievais. As velas acesas, penduradas nas pedras paredes que delimitavam o espaço estreito, para não mais de vinte pessoas, criavam uma atmosfera cúmplice de conspiração. De modernidade, apenas o foco eléctrico fixado no cantor, ele próprio, vestido a preceito, colete e calças de cabedal, camisa de gola e punhos folhados, botins do século treze. Por momentos, esqueci a reacção esquisita de Maria do Céu, quando chegámos. De recuo, como se pretendesse fugir dali.

Devo confessar-te, Maria do Céu! A minha interpretação imediata, quando me sacudiste a mão a segurar-te no braço e recuaste, nas escadas de acesso ao caveau, foi a de que aquele ambiente escuro te trouxera, subitamente, reminiscências do Borboleta Negra. Como lá, as mesas estavam mal iluminadas e acolhiam pares, quase todas, alguns de mãos romanticamente entrelaçadas. De certo modo fiquei contente. Seria, se fosse, um sinal iniludível do meu sucesso na empresa a que me tinha proposto. Se não me enganei, a expressão pintada no teu rosto era de pânico. Que bom, pensei eu. Repulsa. A tua expressão era de repulsa. O puxão firme no teu braço, um pouco firme demais, eu sei, foi ainda dado pelo meu convencimento de que só desenharias uma nova vida em cima da passada, se porfiasses em não a esquecer, se persistisses em fazer da antiga os alicerces da nova. Cheguei mesmo a murmurar-te não adiantar nada fugir, recordas-te? Fugir de fantasmas apenas os torna mais próximos. Vê como eu, também, quiz fugir de fantasmas e acabei no atoleiro da fuga, arrastando-te comigo. Acho não ser necessária muita coragem, Maria do Céu, para esconjurar os fantasmas que vamos deixando crescer em nós desde o berço. Basta percebermos serem criação nossa, basta entendermos não serem eles senão sentimentos deformados pela nossa incapacidade de sentir. Olha, Maria do Céu, os nossos fantasmas íntimos são os filhos defeituosos, os abortos, dum casamento com a Vida condenado ao fracasso. Não te deixaria fracassar. Agarrei a tua mão trémula com firmeza, convencido de que transmitir-te segurança era importante, nesse momento. Decididamente, a minha ingenuidade, adormecida há longo tempo, sob os efeitos do soporífero duma vida cínica e vazia, resolvera acordar, viva, espevitada, naquele serão. Nem sequer suspeitei das razões da tua relutância em tomares o lugar entre o Manuel de Finzes, sentado à cabeceira, e o Miguel Tesoureiro, em frente a mim. Levei à conta de pretenderes ver melhor o que se passava lá à frente. Ou ficar mais próxima da senhora Ana. Fosse por que razão fosse, aceitei tranquilamente a tua reacção. Agradava-me sempre quando te afastavas de outros homens.

(continua)
Magalhães Pinto

MEMORIA


Aquela pequena aldeia não vem nos mapas tradicionais. Só se pode dar conta dela se olharmos para as cartas militares. Ou, então, passando por ela por acaso. Porque ninguém vai a Pitões de propósito. O nome de aldeia é este ou outro qualquer. Não importa. É uma aldeia portuguesa, perdida no sopé de uns montes quaisquer do país pedrícola que somos. Uma dúzia de casas, poucas meias dúzias de habitantes e cabeças de gado. Ovino e bovino. Mais de mil cabeças já teve, dizia o narrador. Agora são escassas centenas. O gado tem diminuído ao ritmo da redução dos habitantes. Na aldeia, uns são pastores. Outros trabalham no campo, produzindo alimento para o gado e algum para a subsistência própria. Um por outro trabalha fora da aldeia. Como o pai de dois dos nossos heróis, que trabalha na construção civil. As casas são de pedra à vista, ao bom estilo rural português. Fogão de lenha, mais lareira que fogão, a ocupar meia cozinha. Enormes. A cozinha e a lareira. Não consta o nascimento de qualqu3er personalidade da nossa história nessa aldeia. Nem nenhum político. Nem nenhum jogador de futebol. Nem os montes são próprios nem as bolas aparecem. A primeira prenda que um dos nossos heróis recebeu na vida foi, ao que contava o narrador, um tractor de corda (ou de pilha, não cheguei a perceber bem) oferecido pela junta de freguesia no Natal do ano passado. Curioso. Um tractor. Parece uma prenda inteligente. A melhor para gente do campo. Prenda igual para todos os miúdos da aldeia. Não mais de seis. Apesar da trivialidade duma vida vivida numa aldeia assim, esta ficou conhecida de meio Portugal. Porque lá, nessa aldeia humilde, mora um exemplo. Melhor, quatro exemplos, ao que parece. O pai não deu a cara. Mas tem que ser também um exemplo para ter uma mulher assim e dois filhos assim.

Não há, na aldeia – nem, ao que consta, perto – autoestradas. Não há portagens. E, por isso, não há boicotes de portagens. Não há centro de saúde. E, se calhar por isso, também não há muitas doenças. Nem baixas da Segurança Social. Não há esquadra de polícia. E, porventura por isso, não há desordens. Nem crimes. Nem droga. Não há jardins ou, então, toda a aldeia é um jardim. Por isso os miúdos brincam no empedrado da calçada. Não há transportes colectivos. Com uma consequência. Nem há protestos contra o preço das passagens e os músculos enrijecem-se no calcorrear dos montes e dos campos. Não há parques de estacionamento. E, por isso, não há automóveis. E, no entanto, os portugueses da aldeia pagam os seus impostos. Quanto mais não seja, o IVA. E o imposto profissional, no caso do pai no nosso exemplo. Seria de esperar que, neste Portugal de protestos, ouvíssemos alguns na aldeia. Mas não.

Na aldeia só há o Daniel, com algo menos de dez anos e guardador de vacas, a irmã, com pouco mais de dez e ajudante de agricultora, e a mãe dos dois, agricultora e mulher que educa os seus filhos como poucas. Todos têm do trabalho um sentido de dever quase lúdico. Sem horários. Sem férias. Sem intervalos para ir à casa de banho. Sem greves. Sem abonos para profissão de risco. Sem reivindicações. Sem azedume. Sem reclamar. Uma família exemplar.

Ouço o coro de protestos pela reposição das portagens na CREL. Reposição e não imposição, não confundamos. Reposição de algo pretensamente abolido por um Governo irresponsável. Que se dá ao luxo de liderar os protestos. Porventura, com a esperança de que, tal como aconteceu na Ponte 25 de Abril aqui há uns anos, a polícia venha e rasgue alguns fatos. Uma náusea profunda invade-me perante os protestos. Não por mim. Mas pelo Daniel, pela irmã e pela mãe. Será uma injustiça enorme fazê-los pagar o custo daquela via rápida. A eles, que não têm autoestrada. Nem centro de saúde. Nem esquadra de polícia. Nem jardim. Nem parque infantil para os Daniéis da aldeia. Nem aparcamentos. Nem pavilhão desportivo. Nem escola secundária. Para eles que, verdadeiramente, só têm trabalho.

Crónica EXEMPLOS - Magalhães Pinto - "Vida Económica" - 5/1/2003


***

Está em curso o encerramento de cerca de 1.300 escolas do primeiro ciclo no centro e norte do país.

SORRISO DO DIA

Maquinista distraído...

PARADOXOS


O paradoxo nacional continua. Segundo o Presidente da TAP, a compra por esta da Portugália vai fazer baixar o preço dos voos na ligação aérea entre Lisboa e Porto. É isto a revisão da teoria económica segundo Fernando Pinto. fim da concorrência provoca baixa de preços.

(Imagem de hangart6.com.br)

PERGUNTAS SEM RESPOSTA


No Millenium/BCP, Jardim Gonçalves e Teixeira Pinto estão mesmo em barricadas diferentes ou a oposição recíproca é apenas um modo de ganharem ambos, seja qual seja o resultado da Assembleia Geral? E, se não for assim, um dos dois vai cair?

PENSAMENTO DO DIA


Uma das primeiras medidas do Governo de José Sócrates, emblemática, foi suspender o contrato de aluguer de helicópteros usados no comvate contra os incêndios florestais. E anunciou que o Estado adquiriria a sua própria frota para o fim em vista. Vai agora contratar o aluguer de dez aparelhos. Fá-lo sem concurso, por ajuste directo. Mais um acto falhado e a sensação de que o "negócio" dos incêndios florestais continua.

FRASE DO DIA



"Ministros erram tiros e comprometem estratégia de comunicação."

Título de "Público" - 27/5/2007

***

Se fosse só isso!... Mas é que os tiros falhados acabam sempre por atingir e vitimar algum inocente...

26.5.07

PERGUNTAS SEM RESPOSTA


A desorientação do Governo, de que fala o "Expresso" desta semana, terá alguma coisa a ver com as suas dificuldades na localização do que quer que seja?

PENSAMENTO DO DIA


Doze candidatos à Presidência da Câmara Municipal de Lisboa. Uma equipa de futebol, com guarda redes suplente. Reservaram a Carmona Rodrigues o papel de guarda-redes suplente. Oxalá não marque ele o golo da vitória.

FRASE DO DIA (II)


"Cavaco quer debate sério sobre aeroporto (OTA)."

Título de "Público" - 26/5/2007

***

Até o Presidente reconhece que o Governo tem andado a brincar...

A DUVIDA - 78º. fascículo

(continuação)

Entre um pastel de bacalhau e um copo de vinho - era verde - ficou aprazada, para o dia seguinte, uma visita ao bairro da lata de Brevilliers, onde quase só viviam portugueses. E já quase em fim de festa, um convite de saída à noite para um espectáculo que os turistas não tinham por hábito ver. O senhor Manuel de Finzes, presidente da Direcção e prometedor empresário do batiment, já com oito empregados de sua conta, todos portugueses, passaria pelo hotel, a buscar-me. Jantar em casa dele, antes. A mulher assaria uma pá de cabrito, bastante mais saborosa que os frangos rotis, a saber a aviário, que aqueles franceses comiam de empreitada. Claro que podia levar a minha mulher. O Miguel Tesoureiro esperar-nos-ia no caveau, para guardar lugar. Era coisa fina, mas levava muito pouca gente. Não me fiz rogado.

Fiquei alguns momentos a observar-te de longe, Maria do Céu, quando cheguei ao hotel, depois da minha ida à associação dos portugueses. Estavas sentada no pequeno lobby, a "ler" atentamente as fotografias dum Jours de France com pelo menos três meses de idade. Curiosamente, só então reparei no teu rosto aciganado, com o nariz recortado quase a direito, emoldurado pelos teus cabelos de azeviche. Eras realmente linda, Maria do Céu! Teria sido um crime se, em lugar de escolheres o Porto como destino de emigrante, tivesses escolhido França. Porque só por acaso te teria encontrado. Um acaso, que, acreditava eu, só acontece nos romances. Não te mostraste muito interessada em saber o que se passara. Naturalmente. Em Rala também havia emigrantes, alguns dos quais voltavam por ocasião das férias grandes e contavam tudo o que acontecia lá pelas Franças, ante os olhos escancarados e vagamente sonhadores dos que tinham ficado. Nem o convite para a noite pareceu espevitar-te. Posta, de repente, num mundo completamente novo, a tua atitude era puramente contemplativa. O que me agradava. Estavas ali, tranquila, sossegada, à minha espera. Fui por detrás de ti e não resisti a pousar um beijo nos teus cabelos. O teu ligeiro sobressalto fez-me sorrir. Sem querer, pensei já irem longe os tempos em que, no Borboleta Negra, um cabrito mais atrevido podia apalpar-te as nádegas, sem sequer olhares para trás. Foi como se te quizesse dar um prémio por isso, que te levei à Place du Tertre e fiz pintar o teu retrato a um grego barbudo e já velhote. Conseguiu capturar, com nitidez, o brilho dos teus olhos. Essa pintura, cela eterna do teu rosto de menina, Maria do Céu, foi a única coisa que quiz que viesse do meu apartamento da Ribeira para aqui. A única não. Também quiz que me trouxessem a máquina de escrever, porque tinha tudo isto para te dizer. Mas a máquina podem levar, assim acabe de te escrever. O teu retrato, pintado por um grego barbudo e já velhote, que conseguiu capturar, com nitidez, o brilho do teu olhar, esse não... Não vou deixar que mo levem... O brilho desses teus olhos tão lindos, não...


(continua)
Magalhães Pinto

SORRISO DO DIA

Não há problema... Vai descer para a cave...

25.5.07

PENSAMENTO DO DIA


Hoje, no café, enquanto tomava o pequeno almoço, um professor secundário sentado ao meu lado quis contar-me uma anedota em que o personagem central era um engenheiro. Curiosamente, antes de o fazer, olhou em redor para ver quem eram os circunstantes.

O medo volta.

FRASE DO DIA


"Em 2006, a criminalidade não aumentou. Antes se assistiu a um reforço da eficácia policial."

Rui Pereira - Ministro da Administração Interna - "Público" - 25/5/2007

***

E o paradoxo continua. Houve mais crimes, mas a criminalidade não aumentou. Estamos na presença de um Governo paradoxal...

PERGUNTAS SEM RESPOSTA




Que é feito do processo Casa Pia?

A DUVIDA - 77º. fascículo

(continuação)

A minha chegada fez deslocar as atenções. Um, que mais tarde vim a saber ser o tesoureiro da direcção, adivinhou quem eu era e aproximou-se logo de mim. Latagão. Um bom espécime do aldeão português, contudo já um tanto envernizado pela urbanidade francesa. Os outros foram-se chegando, meio a medo, até formarem um semicírculo comigo no centro. Toda a gente queria saber novas. Não fui muito útil para os mais velhos. Sabia lá eu se já havia estrada nova para Tortosendo ou se a fiação do senhor comendador, em Vila Flor, estava a despedir mais pessoal. De maior utilidade fui para os mais jovens. Não, a guerra colonial não ia acabar tão cedo. Os batalhões continuavam a embarcar no Cais de Alcântara com a regularidade dum relógio, atrasado mas a funcionar. Ao ritmo dos caixões desembarcados na véspera ou antevéspera. Os lenços da despedida continuavam a acenar, periodicamente, gaivotas acorrentadas, a voar melancolicamente nas margens do Tejo. Dizia-se que as coisas estavam más na Guiné. Tinham mandado para lá o príncipe dos generais, o Spínola. Mas ninguém podia assegurar a verdade, no meio de todos os boatos a ensombrar as notícias oficiais, sempre optimistas, a colocar a culpa da guerra no leste ou nos corredores daquela malvada da ONU. Desiludi-os um pouco, pondo-lhes a fronteira do regresso bem para mais longe. Não se via disponibilidade para uma resolução política e as actividades guerrilheiras, depois de começarem, não acabariam mais.

Depois foi a minha vez de fazer perguntas. Onde viviam. Embora não me fosse de todo desconhecido, não pude deixar de admirar o espírito gregário da comunidade portuguesa. Pássaros fora do ninho, friorentos, encostados uns aos outros na mira de algum calor. Humano, certamente. Como viviam. Havia de tudo, desde aqueles que, incapazes de maiores privações, tinham conseguido arranjar um appartment, até aos que se amontoavam em qualquer canto, para aforrar uns francos mais, religiosamente enviados para a conta do banco lá na vila. A vida nos bidonvilles. Ah!... Uma miséria, exclamou o tesoureiro. Vi logo que ele pertencia à classe dos apartamentados. A lama do chão à mistura com a lama moral. Algumas das filhas mais velhas tinham escolhido um modo de sobrevivência fácil. Saíam ao meio dia para a Rua de Saint Denis e voltavam, normalmente, horas altas da madrugada. Fácil? Será que era fácil? O que faziam. Houve quem me mostrasse as mãos sem unhas, ficadas no manuseamento da borracha ainda quente. Trocadas por francos. Percebi então porque era preciso ter unhas para sobreviver em França. Em toda aquela gente, franco era uma palavra mágica. Por francos se faria tudo. Por francos se vendia o corpo, se entregava a alma. O ensino das crianças, em escolas portuguesas. Aonde? Os mais conscientes tinham os filhos em escolas francesas. Não era raro os filhos serem os professores dos pais, no ensino dos rudimentos da língua. Porque, no dia a dia, os pais não iam muito além do patois. A assistência das autoridades. A legalização dos clandestinos. O senhor cônsul era uma jóia. A todos atendia bem. Era pena que não fosse mais ajudado pelos de Lisboa. As hipóteses de regresso, ah! isso para quando a casita lá na aldeia estivesse acabada e assegurada fosse a pensão da Sociale! Ou se acabasse a guerra, diziam os mais novos.

(continuação)
Magalhães Pinto

SORRISO DO DIA

Os computadores são japoneses, Mas o cinzeiro é português, produto já do choque tecnolópgico...

24.5.07

FRASE DO DIA (II)


" O problema do aeroporto na margem sul do Tejo é que é preciso atravessar pontes para chegar a Lisboa; e, hoje, há os actos de terrorismo..."

Almeida Santos - aos órgãos da Comunicação Social - 24/5/2007

***

Não sei se está a ver, meu Caro Visitante. Uma avioneta acabou de levantar voo do aeródromo de Cascais (que tem pouca vigilância). A bordo, segue um paquistanês, carregado com vinte quilos de trotil (que é a bagagem permitida). Domina o piloto do calhambeque aéreo. Toma os comandos. E aponta à ponte 25 de Abril. Tem por motivação castigar os adversários da OTA e punir postumamente o odioso Salazar, o homem qeu deu o nome de baptismo da ponte (o nome foi posteriormente alterado no Registo Civil). Com uma precisão milimétrica, derruba um dos pilares centrais. A ponte cai estrondosamente. Mas ele nem olha. Prossegue. Em direcção à ponte Vasco da Gama. passa devaixo dela naquele ponto mais elevado. rapa de um quilo de trotil e faz um buracão enorme no piso da ponte. Aproveita para ganhar altura, passando pelo buraco. E dirige-se para o seu objectivo final. A ponte de Vila Franca. Tem que planar durante algumas milhas, porque a gasolina está a acabar. Acende o cordão lento, cuidadosamente calculado para fazer explodir o trotil mesmo em cima da ponte. Lá se vai a última. Aterra na lezíria e vai almoçar a Alcochete. Estã tudo vingado! Enquanto vai tosquinhando umas azeitonas, redige a carta para o Guiness, na qual se dá a conhecer como o único terrorista a conseguir, num só golpe, derrubar três pontes.

Esta história não está completa. Havia um personagem cuja senilidade dava muito nas vistas. Mas já não me recordo quem era. Desculpe lá, Caro Amigo...

Magalhães Pinto

FRASE DO DIA


"Subsídios à electricidade verde serviram para financiar rega nos campos de golfe."

Jorge Talixa - "Público" - 24/5/2007

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E então?!... O verde já lá está e não consta que a electricidade seja visível...

PENSAMENTO DO DIA


Veículo antigamente chamado ambulância, transformado em maternidade pelo Ministro António Correia de Campos, o que faz deste um sério candidato ao Prémio Nobel da Física no próximo ano.

PERGUNTAS SEM RESPOSTA


Se o porco tem quatro pernas, de onde virá o fiambre da perna extra?

(gentileza de José Rocha)

A DUVIDA - 76º. fascículo

(continuação)

Fui recebido com honras de vipe. Para os emigrantes portugueses, encontrar um compatriota de passagem é sempre uma romaria. A Senhora da Alegria, com a procissão dos amigos e familiares, as crianças a servirem de anjinhos. Sem senhor abade, a não ser que o mais evidente do escasso círculo de relações a isso se preste. É a oportunidade de falar com um igual, de atabafar os recalcamentos da servidão com o alarde duns francos ganhos à custa do sol a sol. É como se arrolassem, a cada momento e desesperadamente, uma testemunha credível para a correcção dum salto dado, numa noite escura como breu. Apesar dos trabalhos, dos sustos, das privações. É como se quisessem convencer os outros, os sem coragem para abandonar as berças, um a um, de ter sido aquele o único meio de limpar da pele o estigma da miséria. Daí, a festa. E se, como era o meu caso, a testemunha era daquelas que iam mesmo dar testemunho público, então a festa não dispensava sessão solene. Os homens vestiam o último fato adquirido no sentier, com calças à boca de sino, e engravatavam floridamente a camisa de nylon ainda por estrear. As mulheres usavam a última novidade garrida do Printemps, de saia comprida e às pregas, e enfeitavam-se com as marroquinices do marché des puces. Como ia longe o tempo das roupas escuras e do lenço a guarnecer a cabeça, quando não uma rodilha a servir de base ao carrego! O brio, nas crianças, tinha a forma de sapatos, habitualmente grandes, porque estão a crescer muito depressa, sabe como é, aqui manjam muito melhor.

Aquele salão devia ter sido, até há pouco, uma mercearia. Com a clientela predominantemente portuguesa. Ainda se sentia o cheiro de bacalhau, incrustado nas paredes dum ocre deslavado, nas quais, em tom menos sujo, havia ficado impressa para sempre, a silhueta duma estante. Estava quase cheio, o salão. Homens e mulheres. Uma relativa surpresa para mim, que esperava encontrar apenas a direcção. Apenas isso tinha pedido, na correspondência trocada antes de vir. Num canto, uma mesa com fortes reminiscências de portugalidade. A toalha branca, de linho, com bordados de Viana. Os pastéis de bacalhau. Os croquetes. As rodelas de salpicão, aqui estragado o purismo pelo retoque dumas tantas fatias de salame italiano. No bar improvisado, os característicos garrafões, de cujo conteúdo as bordas não deixavam dúvidas: tinto, provavelmente verde, seguramente bom. Eram aguerridas as provas de vinhos no período a seguir às férias. Cada qual se esmerava no petróleo là do sítio. E muito barulho. Dum disco do António Mourão, roufenho já, de tantas vezes tocado. Paradoxal. Ó tempo, volta pra trás. O que ninguém devia querer, embora não se furtando à nostalgia da aldeia lá longe. Muito barulho. Das conversas em voz alta, a lembrar o mercado da Ribeira em dia de sável aos centos. Muito barulho. De algumas crianças, a jogarem ao pilha por entre as cadeiras pretensamente alinhadas.

(continua)
Magalhães Pinto

SORRISO DO DIA

Antevisão da primeira aterragem de um avião na OTA...

23.5.07

AVISO

Se quiser enviar alguma das postagens presentes neste blog, apenas tem que clicar no sobrescrito que se encontra no rodapé de cada um e prosseguir.

O CEU E O INFERNO


Vendo-a pelo preço porque ma venderam. Vieram segredar-me aos ouvidos que a anedota contada pelo Professor Fernando Charrua sobre o Primeiro-Ministro foi a que deixo abaixo. Previno que pode não ser verdade....

***

José Sócrates morreu. Deus e o Diabo brigam porque nenhum dos dois quer ficar com ele. Sem acordo, pedem a mediadores uma solução os quais decidem por um compromisso:

- Que se alterne a sua presença um mês no Céu e outro no Inferno!

No 1° mês , Sócrates vai para o Céu. Deus não sabe o que fazer. Quase enlouquece! O engenheiro diz mal de tudo, põe em causa todos os elementos de oração e da liturgia, dissolve o sistema de assessoria pessoal dos anjos, suborna as nuvens, transfere 1 km quadrado do Céu para o Inferno, nomeia arcanjos provisórios aos milhares, intervém nas comunicações aos Santos, troca as placas das portas de São Pedro, envia um projecto de lei aos apóstolos para reformular os Dez Mandamentos e amnistiar o Diabo.

O Céu transforma-se num caos!!! As pessoas não o suportam mais!!! Anjos-magistrados, Anjos-funcionáriosjudiciais, Anjos-militares, Anjos-GNR.s, Anjos-polícias, Anjos-bombeiros, Anjos-médicos, Anjos-enfermeiros, Anjos-professores, Anjos-funcionários públicos, etc., convocam greves, protestos, manifestações, vigílias, marchas...

O descontentamento é geral. Deus passa a contar cada minuto até ao fim do mês para o mandar para o Inferno. Quando Sócrates finalmente se vai, Deus respira de alívio. Mas lá para o dia 20, começa a sofrer novamente pensando que, dentro de 10 dias, tem que voltar a vê-lo. No 1º dia do mês seguinte nada acontece. No 5° dia, ainda sem notícias, Deus estava feliz. Mas começou a pensar que, tendo passado mais tempo no Inferno, Sócrates poderia querer passar dois meses seguidos no Céu. Desesperado com a mera hipótese, Deus decide contactar o Inferno por "banda larga" para perguntar ao Diabo o que estava a suceder...

Ring... ring... ring...!!!

Atende um assessor e Deus pergunta:

"- Por favor, posso falar com o Diabo?"

"- Qual dos dois?", responde o assessor, "- O vermelho com chifres ou o do simplex?"

***

Se foi esta, estamos perante um inocente sorriso relativamente a outras que já me contaram. Além de que a gente sabe que o inferno só existe para os vivos...

(Imagem de pranchetadohals.com.br)

FRASE DO DIA



"Os nossos políticos julgam-se capazes de atingir a grandeza pelo singelo método de se promoverem uns aos outros."

Rui Ramos - "Público" - 23/5/2007

***

Começam a ser tão poucos que, um dia destes, terão que recorrer à auto-promoção...

PENSAMENTO DO DIA


O Banco de Portugal vendeu, no ano passado, 561 milhões de euros do ouro das reservas; mas chegou ao fim do ano com mais 100 milhões. Um fenómeno coerente com estarmos cada vez mais pequenos à medida que crescemos economicamente e com termos cada vez mais desempregados à medida que cresce o emprego.

PERGUNTAS SEM RESPOSTA



O Gabinete de Esclarecimento, agora criado, sobre o novo aeroporto da OTA dá esclarecimentos ou recebe esclarecimentos?