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29.3.07

A DUVIDA - 21º. fasciculo

(continuação)

Tal avalanche de palavras era susceptível de rebentar com a barragem mais bem construída do mundo. E agora era verdade, um sorriso, leve sorriso, brincava nos olhos de Maria do Céu. Enquanto mastigava, olhava-a de soslaio, apreciando o seu nariz aquilino, com reminiscências aciganadas. Era realmente bela! Um sabor a vitória temperou ainda melhor o meu bife, na realidade delicioso.

Quando terminamos o jantar, eram já horas para Maria do Céu estar no "Borboleta". Não obstante, nem por uma vez sequer a vi olhar para o relógio. Nem eu lho lembrei. Sentia-me bem, embora levemente inquieto, ansioso, desejoso de um tempo imobilizado que fizesse do momento uma estátua. A hora de deixar o restaurante chegou. Apercebi-me disso quando o chefe de mesa, depois de delicadamente nos ter perguntado se queríamos algo mais, depositou à minha frente a caixa de estanho de onde espreitava a ponta duma factura. Pilares dos quatro cantos da sala, outros tantos empregados, imóveis, olhavam-nos sem expressão, numa exigência muda do fim do dia que nós retardávamos. Saimos, depois de pagar a conta.

Fizemos a longa viagem de elevador em silêncio, olhando-nos. A caminho do parque de estacionamente, ali mesmo ao lado, sentia-a estremecer com um arrepio de frio e, atenciosamente, cobri os seus ombros com o meu braço esquerdo, aconchegando-a a mim. Abri-lhe a porta do carro, fechei-a, dei a volta, entrei, liguei o motor e olhei-a uma vez mais. Para onde vamos? Fixou-se no para-brisas e não me respondeu. Deixei o automóvel deslizar, lentamente, rampa abaixo. E dirigi-me para o meu apartamento.

(continua)

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