(continuação)
Há cinema aos sábados. Ao ar livre. Por isso, nunca se sabe, na época das chuvas, se há ou não sessão. E se há, também nunca se sabe se chega ao fim. Quando chove na Guiné é preciso saber nadar. Uma das cenas mais hilariantes aconteceu quando, no “Beau Geste”, um dos legionários está a morrer à sede, enquanto a água da chuva escorria, em catadupas, pela tela abaixo.
A ida ao cinema é sempre um ritual burguês. Começa aí pelas sete da tarde com um minucioso banho. Até os mais preguiçosos lavam a cabeça nessa altura. Faz-se, de seguida, a barba, escanhoando os pelos mais resistentes e espremendo, ao mesmo tempo, imaginários pontos negros. Aparam-se as unhas. Desodorizam-se bem as axilas. E despejam-se frascos de água de colónia barata, até cada qual já não saber ao que cheira. Nos dias de cinema, todos querem imitar o Álvaro. O vestuário é objecto de cuidados especiais. E, verdade se diga, as lavadeiras já aprenderam que, nesses dias, as calças hão-de ser entregues impecavelmente enfestadas. Por fim, a tarefa mais complicada. Conseguir acamar, com a ajuda de fixadores e brilhantinas, a selva de cabelos, rebeldes por dias e dias de uso do capacete ou do quico. Depois de meia dúzia de espreitadelas preocupadas nos espelhos, é tempo de ir à sessão.
(continua)
Magalhães Pinto
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