POR UMA VEZ
É meu dever colocar-me ao lado do Presidente da Câmara de Matosinhos. No diferendo que parece opô-lo ao Presidente da Associação Empresarial Portuguesa, Engº. Ludgero Marques. Em causa, o alargamento da Exponor, em Leça da Palmeira, acrescentando a verdadeira floresta de cimento que já existe nas imediações. Com todas as sequelas, em termos de tráfego e pressão urbanística.
Recordemos que, para a zona da Exponor, foi aprovado, há alguns anos, um projecto relativamente gigante, quando foi necessário dar solução à falência da Facar sem grandes convulsões sociais no município. Foi essa aprovação a permitir que os trabalhadores daquela empresa falida recebessem tudo quanto, em tal situação, tinham a receber da empresa, incluindo as indemnizações. O processo foi límpido e em nenhuma circunstância a Câmara Municipal de Matosinhos foi colocada sob pressão. Decidiu o que tinha a decidir em inteira liberdade.
Diferente se passa agora. O Presidente da Associação referida ameaçou retirar a Exponor de Matosinhos ou, pelo menos, ir fazer para outros municípios o que aqui se propõe fazer, se o projecto imobiliário que pretende não lhe for autorizado como pretende. Atitude que eu julgo enfermar de dois vícios importantes. O primeiro é que o Senhor Engenheiro já se esqueceu, possivelmente, de todas as contrapartidas de que beneficiou, tanto por parte da Câmara como vindas do Estado. O segundo é que é inadmissível tentar condicionar o poder político na sua tomada de decisões que afectam toda a população. E é tanto mais inadmissível quando quem o faz tem algum poder. Não apenas político, mas também económico.
Acho que estes casos só sucedem porque não existe, nos cidadãos, uma consciência cívica bastante desenvolvida. Se os cidadãos comuns estivessem habituados a cuidar das coisas da sua terra, uma intervenção como a da Associação Empresarial Portuguesa nunca se daria. A pressão feita por esta – como tantas outras pressões efectuadas sobre os detentores dos cargos políticos – só serão possíveis enquanto a discussão destes assuntos se passar numa esfera alta, que engloba apenas os políticos, os economicamente poderosos e os órgãos de comunicação social. No caso vertente, o cidadão comum não quer saber se se fazem mais casas num dado lugar ou não. Dá mais importância a uma vitória da equipa de futebol que apoia do que à acumulação de mais umas dezenas de milhar de metros quadrados de cimento no espaço onde vive. Mas depois, casas feitas, vai passar o resto da sua vida com dores de cabeça porque o trânsito está caótico, porque não há lugar para estacionar, porque há inudações devido à impermeabilização dos terrenos, porque não há escolas que cheguem para os filhos, porque a droga surge como em todos os grandes aglomerados populacionais e com mais uma infinidade de problemas.
Tenho dito e repetido que isto há-de resolver-se quando, em todos os órgãos autárquicos, houver um conselho fiscalizador não comprometido partidariamente, constituído por empresários, professores, médicos, representantes de associações económicas e profissionais, representantes de instituições protectoras do ambiente, órgãos da comunicação social, cidadãos comuns apenas essa qualidade, de cidadãos. Isto é, uma autêntica assembleia autárquica. Sei que não está para tão cedo uma tal solução. Mas não me calarei, Um dia, é assim que o poder será fiscalizado e controlado. Até lá, batamos as palmas a quem, como Narciso Miranda, pelo menos nesta ocasião, se opuser à chantagem dos poderosos.
Magalhães Pinto, em MATOSINHOS HOJE, 10/9/2002
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