ÉTICA EM FARRAPOS
Numa palestra proferida perante alunos e professores de uma escola do distrito de Portalegre, o governador civil daquele distrito, Jaime Estorninho, afirmou que – e cito – “quando é necessário mentir, tenho que mentir, sempre que estejam em causa valores maiores do que o da verdade”. Sensivelmente isto. A palestra, subordinada ao tema “Ética Profissional”, tinha por fim bater-se pela restauração de valores que a sociedade portuguesa tem vindo a perder aceleradamente. Foi lamentável este comportamento do senhor governador civil de Portalegre.
Até podemos admitir que ele tenha falado verdade, ao dizer o que disse. Creio que todos nós dizemos uma mentirazita uma vez por outra. Naturalmente, há alguns que se vê à légua que nasceram para mentir. Em Portugal, abundam e alguns deles encontram-se mesmo colocados a níveis muito altos da nossa organização social. Mas uma coisa é mentir. Outra coisa é admitir que a mentira se justifica por si própria. Imaginem o que pensará um jovem, que é castigado por ser apanhado numa mentira sobre, por exemplo, onde é que passou a noite finda, ao saber que, a níveis elevados da administração do Estado, se mente e, mais do que isso, se admite que a mentira é necessária e coisa boa. É a perversão total da responsabilidade social. É o fazer em farrapos a ética que nos deve nortear, mesmo se alguma vez não obedecida, no nosso relacionamento com os outros. É a contribuição para que este Portugal que amamos seja cada vez mais um país de aldrabões que nada nem ninguém no mundo pode ter em consideração. O senhor governador civil de Portalegre mostrou, com a sua atitude, que não tem o mínimo sentido das responsabilidades e que nada o recomenda para o posto que ocupa. Melhor fora que, colocado entre o dever moral de falar verdade à assistência e o dever de contribuir para um Portugal mais sério, deveria, pelo menos desta vez, ter mentido. Mais mentira menos mentira não lhe faria mal e, assim, não estragaria os outros.
Não sei o que vai acontecer ao senhor governador civil. Provavelmente, nada. Afinal, ele tem por perto quem minta mais do que ele e a quem nada acontece.
Magalhães Pinto, em RÁDIO CLUBE DE MATOSINHOS, em 8/6/2010
Sem comentários:
Enviar um comentário