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1.7.09

CRÓNICA DA SEMANA (II)

Há dias, dei por mim a reflectir sobre se existiriam semelhanças ou diferenças na actuação de cinco personagens do mundo financeiro que, nos últimos vinte anos, encheram as páginas dos jornais e preencheram horas da programação da rádio e da televisão: Dona Branca, Bernard Madoff , João Rendeiro, Oliveira e Costa e Jardim Gonçalves. Não que isso tivesse alguma utilidade pública. Mas porque me sentia intrigado pela maneira, aparentemente fácil, como tanta gente se deixava prejudicar por personagens que podiam, na essência, ser muito mais idênticos do que à primeira vista se podia pensar. Recordemos as personagens.

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Olhadas as pinceladas grossas destes casos, vemos alguns traços semelhantes e algumas diferenças. Não se podem isentar de alguma culpa os prejudicados nos casos Dona Branca, Madoff e BPP. Nesses casos, funcionou, de modo evidente, a cupidez dos investidores. Convencidos do ganho fácil. Para que estes não sejam casos típicos do “conto do vigário”, falta, a meu ver, um dado essencial: a vontade de enganar dos principais personagens. Quer a Dona Branca, quer Madoff, quer Rendeiro, estariam sinceramente convencidos, eles também e ingenuamente, de que o esquema se pagava a si próprio. Não fora as crises surgidas e o esquema ter-se-ia aguentado muito mais tempo, com ainda maiores prejuízos. São eles, esses gestores – muito menos no caso da Dona Branca do que nos outros dois - culpados de incompetência. Eles e as autoridades que permitiram que incompetentes se apresentassem no mercado como personagens idóneas. Nem sequer entendo como é ninguém assaca ao Banco de Portugal essa falha.

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O caso de Jardim Gonçalves e do Millennium/BCP é, provavelmente, o mais diferente de todos. Quer nas motivações, quer nos actos. Há dias, vi para aí estampado, em jeito de defesa dos culpados, “que os factos imputados não eram crime porque os autores não tinham a intenção de prejudicar”. Não pude deixar de sorrir amargamente. Como é que se pode jogar um argumento destes? Então os autores não estavam a enganar deliberadamente? Mais, não estavam a controlar artificialmente as cotações das respectivas acções na Bolsa, num fenómeno aparentado ao “inside-trading” proibido pela Lei? Não tinham consciência do que estavam a fazer? Mais. Uma vez que todos eles – e particularmente Jardim Gonçalves – eram grandes accionistas do Banco, não eram detentores de “informação privilegiada” relativa às manigâncias? E terão aproveitado ou não da detenção dessa informação privilegiada? Há um paralelismo assustador no modo como tudo isto foi feito e no modo como o BPA foi “comprado”, ante a complacência das autoridades. Também então, o BCP não tinha capacidade financeira para “engolir” o gigante comercial. Mas a artimanha foi montada, atirando-se para a frente as consequências da irregularidade. No caso da OPA, o esquema foi bem sucedido. Ao contrário de agora. Apenas porque, agora, uma crise económica – e também institucional – impediu a ocultação.

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Excertos da crónica SEMELHANÇAS E DIFERENÇAS - Magalhães Pinto - VIDA ECONÓMICA - 1/7/2009

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