Juro que, da agricultura, pouco mais sei do que semear uns coentros e colher uma maçã directamente da árvore. Defeitos de quem nasceu na cidade. E a quem a verdura dos anos não deixou assimilar algo mais, nos tempos da infância, quando o Verão era passado com os avós, nas arribas do Douro. Esses sim, os avós, a saberem tudo e mais alguma coisa. Por isso, por essa ignorância, deveria agora era meter a viola no saco, estar calado, e olhar para os fenómenos agrícolas como o boi olha para o palácio. O que até não estava mal. O boi, animal de campo, não sabe nada da cidade. E eu, homem da cidade, não percebo patavina do campo. Razão mais do que suficiente para que tenhamos atitudes opostas, o boi e eu, mas semelhantes na sua essência.
Porém, antes de ser da cidade, sou português. E como bom e mediano português que sou, aqui estou eu a meter a colher naquilo para que não sou chamado. Aliás, creio que o problema é mesmo esse. Há muita gente a meter a colher nestas coisas da agricultura. Pelo menos, é o que posso deduzir quando ouço dos rios de dinheiro injectados pelos contribuintes europeus na agricultura portuguesa, durante os últimos vinte anos, sem que se veja para onde foram. Rios de dinheiro. A dar para encher outra Alqueva. E aflige-me isto. Porque tenho assistido à permanente acusação feita aos empresários têxteis e aos seus ferraris. Mas não vejo ninguém pedir contas aos beneficiários das ajudas comunitárias para a agricultura.
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Excerto da crónica O PENSAMENTO E AS CEREJAS - Magalhães Pinto - VIDA ECONÓMICA - 3/6/2003
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