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18.5.11

MEMÓRIA

ESCOLHER

No próximo Domingo iremos, uma vez mais, às urnas. Para escolher o que se deseja ser um Governo para os próximos quatro anos. Depois de uma campanha matizada por inúmeros factos sem grande importância para os cidadãos, ainda que possam ter muita para os fazedores de jornais. É minha opinião que nunca, como agora, o resultado foi tão duvidoso. Por duas razões, essencialmente. Por um lado, sendo evidente que grande parte dos órgãos da comunicação social não gosta de Santana Lopes - desde que um membro do seu Governo se insurgiu contra ela - e as notícias nos surgem enoveladas num desejo de o deixar mal colocado, escondendo uma também evidente mobilização do povo apoiante do PSD, a dúvida sobre o resultado subsiste. E, por outro lado, a evidente subida de popularidade do Partido Popular pode conduzir a resultados que, em termos de mandatos, sejam desastrosos para o Partido Socialista, tendo em conta os objectivos de maioria que este apregoa. Aliás, o subtil facto de que o Partido Socialista já deixou de falar na maioria absoluta de votos, para falar apenas na maioria absoluta de mandatos, mostra a insegurança que, apesar das aparências, reina nas suas hostes. Mas também pode acontecer que o Partido Socialista efectivamente tenha a maioria absoluta e as sondagens acertem desta vez, depois de tantas vezes terem falhado no passado.

De todos os resultados possíveis, há um que poderia ser desastroso para os cidadãos. Um resultado todavia possível. Qual seria o do Partido Socialista ganhar as eleições e, não obstante isso, o PSD e o PP obterem a maioria dos mandatos na Assembleia da República. Para que isto aconteça é necessário algo que não se afigira fácil. Todavia possível. Que seria o PP ter uma vantagem de deputados sobre o conjunto comunista/bloquista que mais do que compense a perda de deputados do PSD em relação aos socialistas. Se o resultado fosse este, aliás dramático, o Presidente da República ver-se-ia obrigado a chamar para formar Governo quem não dispunha de condições para fazer passar o seu programa na Assembleia. Poderíamos bem cair num impasse governativo, com necessidade de novas eleições a curto prazo. Ou poderiam os partidos deixar governar um Partido Socialista em minoria na Assembleia, mas com a instabilidade política que facilmente se adivinha. E, obviamente, com novas eleições a curto prazo.

Excluindo este caso, a escolha, apesar de todo o ruído, aparenta ser fácil para os Portugueses. Sobretudo se tiverem em linha de conta um facto que todas as pessoas responsáveis em Portugal não escamoteiam. A austeridade financeira do Estado vai ter que continuar, ganhe quem ganhe as eleições. O tempo vai continuar a ser de vacas magras. E é imperioso que assim seja. Este mandato, se estável, vai até 2009. E, a partir de 2013, acabam os fundos da Europa que vêm para Portugal. Se não aproveitarmos bem o tempo que falta, para sanear o país e desenvolver a economia - o que só se fará com rigor e austeridade - cairemos num fosso de imprevisíveis consequências.

É aqui que se impõe não esquecer o passado. É aqui que é preciso ver quem mais sentido de Estado tem demonstrado no Governo. É aqui que a escolha dramática - é sempre dramático escolher sacrifícios - se impõe. E esta é a opinião quase unânime de toda a gente responsável, não comprometida com a política, existente em Portugal. É aqui que entra um estudo feito pelo deputado do PSD e economista Miguel Frasquilho - o seu partidarismo não retira um átomo de verdade à verificação, porque não estamos a lidar com opiniões ou adivinhações, mas sim com factos. Segundo esse estudo, são factos históricos os seguintes:

- Nos últimos vinte anos, dos dez Governos que menor défice público mostraram, oito são social-democratas e apenas dois são socialistas;

- Se reduzirmos a análise apenas aos cinco melhores, todos eles são social-democratas; aparece em sexto lugar o Governo socialista que teve o malogrado Sousa Franco como Ministro das Finanças;

- Sintomático, ainda, é o facto de os três Governos com maior défice terem sido, precisamente os que vão de 1999 a 2001, ambos inclusivé, anos que, como sabemos, estão na raiz do verdadeiro desastre que hoje ameaça as finanç sas públicas;

- Ainda sintomático é o facto de a Ministra das Finanças Manuela Ferreira Leite aparecer com o sétimo melhor défice, apesar de haver de governar em clima de grave recessão económica e de ter que haver-se com o crescimento abrupto e relativamente gigantesco do subsídio de desemprego.

Isto quanto ao défice das contas do Estado. Se o ângulo de visão for o da contenção da despesa pública, os dados são ainda mais avassaladoramente favoráveis aos social-democratas. Veja-se:

- Os dez Governos mais poupados nos últimos dezanove anos foram todos social-democratas;

- Os socialistas aparecem apenas em décimo-primeiro lugar; e, com governos socialistas, sempre a despesa pública cresceu acima dos 3,5% num ano, depois de descontada a inflação;

- Curioso verificar que os Ministros das Finanças que melhor administraram o Estado deste ponto de vista foram Miguel Cadilhe, Braga de Macedo e Manuela Ferreira Leite.

Entende-se, neste quadro, porque Santana Lopes apareceu publicamente a anunciar que, se for Governo, pretende Miguel Cadilhe para seu Vice-Primeiro Ministro e responsável pelas áreas económica e financeira. Entende-se e elogia-se. Com esta atitude, Santana Lopes pretende dizer que não é seu objectivo abandonar a política de rigor na Administração do Estado. Nem outra coisa se poderia esperar do antigo Ministro das Finanças de Cavaco Silva. Por um lado, porque ele é dos que afirma a necessidade de continuar esse rigor. Por outro lado - como bem sabem os que o conhecem bem - é um homem de personalidade muito forte, capaz de bater o pé seja a quem seja, e de um rigor profissional acima de toda e qualquer dúvida. Qualidades que nem o eventual Primeiro-Ministro socialista se pode orgulhar.

Neste quadro, e tendo em conta a história e a essência das intenções anunciadas, os termos da escolha para os Portugueses aparecem com bastante clareza. Ou pretendemos aliviar o cinto e desfrutar de alguns anos mais fáceis do que estes que vimos vivendo. Ou pretendemos manter o cinto apertado até que seja possível melhor vida. Este é, em minha opinião, o autêntico dilema que se coloca aos Portugueses nestas eleições. E, para resolvê-lo, temos a estrita obrigação de não olhar apenas no curto prazo. Pensar Portugal apenas para os próximos três ou quatro anos pode ter consequências terríveis no futuro mais alargado. Julgo não ser muito atrevido ao afirmar que, se os próximos quatro anos forem de governação socialista e essa governação tiver os matizes dos Governos de António Guterres, teremos hipotecado o (pouco) que nos resta de sermos, num futuro mais alargado, um país desevolvido. A razão que me assistiu quando, escasso meio ano depois de entrada em funções do Governo socialista de Guterres, escrevi nestas colunas que tinha sido trágico para Portugal o resultado das eleições, autoriza-me a dizer isto também. Se não escolhermos bem, o mais provável é que a prazo não muito longínquo apenas sejamos, relativamente à Europa, ou párias ou escravos.

Magalhães Pinto, em VIDA ECONÓMICA, em 15/2/2005

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