(continuação)
Desfilam, na tarde calma,
as brumas dum passado inventado,
que aproximam do inverno
pequenos remendos da alma...
Como barcos de velas desfraldadas,
despontam no horizonte
- ainda não estavam lá há um bocado -
os restos do inferno,
as chamas resfriadas,
que, na Vida, sempre tenho tido a monte...
São fantasmas pequeninos
que engrandecem
a cada instante que passa...
São silenciosos sinos
que emudecem,
como arautos da desgraça...
São vidros cortantes
que deslizam
no gelo da indiferença...
São ecos gritantes
que baptizam
os mil nomes da querença...
São facas, são gumes,
são fogos, ciúmes,
são pranto que ninguém secará,
porque daí, dessa bruma,
da dor que se esfuma,
ela jamais sairá...
Desfilam na noite adormecida
os sonhos dum futuro por inventar,
que vegetam no que resta
da vida longa vivida....
Como gaivotas feridas na praia,
descansam na areia
- ainda não estavam lá há um bocado -
lembranças encarquilhadas...
Imitações de cambraia
com rendas de sal e espuma....
Não são mais do que miragens
desvanecidas
a cada instante que passa...
Inacabadas viagens,
adormecidas,
na barcaça da desgraça....
Não são mais do que desejos
à procura
de quebrar a indiferença...
São, de mil Judas, os beijos,
na noite escura
duma feroz malquerença....
São murmúrios, são gritos,
chamamentos aflitos,
são pranto que ninguém secará...
Porque daí, desse sonho,
de sobressalto, medonho,
ela jamais sairá...
(continua)
Magalhães Pinto
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