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20.2.08

OS HERÓIS E O MEDO - 180º. fascículo

(continuação)

Mário raramente ganhava. Nunca arriscava muito e eram mais as vezes que passava do que aquelas em que apostava. E, quando apostava, eram sempre valores baixos, fosse qual fosse o valor existente na mesa. Razão pela qual quase sempre chegava ao fim do jogo com saldo negativo. Mas gostava de jogar este jogo. Fascinava-o a facilidade com que os jogadores assumiam o risco. Um risco tão mais facilmente assumido quanto maior fosse a quantia na mesa. Não raro, de valor superior ao pré de todos os jogadores em conjunto. Nem sequer era a avidez do dinheiro. Não havia muitas alternativas para gastá-lo. Era como se, nessa assunção do risco, dessem vazão ao medo com que viviam os seus dias. No fim, eram uns pesos a menos ou uma dívida a mais. Recuperáveis no dia seguinte. Ou no outro. Ou no outro. Nada de semelhante ao risco corrido no mato, onde a diferença entre a sorte e o azar podia ser definitiva, sem possibilidades de recuperação. Fascinava-o, também, ver as reacções dos jogadores, sobretudo à perda. O ganho não chegava a entusiasmar. A adrenalina subia essencialmente com a perda. Era ver a ansiedade com que um perdedor, obrigado a dobrar o valor existente na mesa por ter perdido um “abafa”, seguia o jogo até voltar a ser a sua vez de apostar, não fora algum mais afortunado retirar da mesa a possibilidade de recuperação. Subindo, subindo sempre, o grau de risco admitido. Como se, tendo perdido a vida, quisesse rapidamente reganhá-la.

(continua)
Magalhães Pinto

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