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28.2.07

CRÓNICA DA SEMANA


"A administração e os accionistas da Portugal Telecom (PT) têm, obviamente, todo o direito de se defender de uma OPA hostil. E diz-se OPA hostil qualquer tentativa de tentar obter, no mercado, o controlo de uma empresa cotada, sem antes ter articulado a operação com quem manda nela.

Uma OPA hostil pode ter várias defesas. Umas - como as que levam a Autoridade para a Concorrência (AC) e a Comissão para o Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) a pronunciarem-se - não dependem da empresa "opada" ou dos seus accionistas. Tais defesas destinam-se a proteger seja os consumidores dos serviços do sector onde se inserem as empresas em luta ou a proteger os pequenos investidores no mercado de capitais. Entendem-se tais cuidados. Por um lado é necessário evitar situações de monopólio num dado sector económico. E, por outro lado, os pequenos investidores não podem estar à mercê de toda e qualquer decisão dos grandes investidores, sabido como é que os interesses de uns e outros não são, muitas vezes, concorrentes. A propósito desta última razão, veja-se, por xemplo, a posição do Banco Espírito Santo (BES), o qual, sendo um accionista de referência da PT, vê passar pelos seus balcões muito da actividade financeira desta última, privilégio que se arrisca a perder, se a OPA da SONAE tiver vencimento, em favor dos bancos que apoiam a empresa de Belmiro na OPA.

...

Ora bem. Há um meio que está tentativamente a ser utilizado pelos grandes accionistas minoritários da PT que parece menos legítimo. É o da blindagem dos estatutos. Em que consiste isto? Em ter, nos estatutos da empresa, uma cláusula impondo um limite aos votos de um só accionista, seja qual seja a percentagem de acções que têm. E isto é importante pela seguinte razão. Imagine-se que tal limite é fixado, na PT, em 15%. Isto quer dizer que, enquanto tal cláusula estatutária não for removida, a SONAE, mesmo que adquira mais de cinquenta por cento do capital, não terá, em Assembleia Geral da PT mais do que 15% dos votos, sendo facilmente bloqueada; continuando um exemplo, chegariam três accionistas com 10% de capital cada um. A OPA não teria, portanto, consequências, mesmo que bem sucedida.

O bloqueio parece ser à tentativa de hegemonização do poder social numa empresa. Mas não é. Quando isto acontece, o bloqueio é ao próprio mercado. Manda quem tenha a minoria de bloqueio, não apenas face aos interesses de um eventual "opante", mas também face aos pequenos accionistas. Um mercado de valores mobiliários com pureza não deveria admitir à cotação empresas com semelhante instrumento de defesa nos seus estatutos. A Assembleia Geral da PT da próxima Sexta-feira tem por principal objecto decidir se se remove tal cláusula dos estatutos da empresa ou não. Algo que se encontra relativamente viciado, uma vez que a minoria de bloqueio também funciona para essa decisão.

É aqui que entra o Conselho de Administração da empresa. O qual, no caso da PT, tem oferecido considerável resistência ao "opante" E é caso para perguntarmos com que legitimidade. É tido por legítima esta defesa desde que o Conselho de Administração entenda que está a defender os interesses de todos os accionistas, grandes e pequenos, e não apenas dos grandes. Pelo menos, da maioria deles, em capital traduzida. E quais são os argumentos que tem utilizado o Conselho de Administração da PT? Principalmente dois, a saber:

- A PT vale mais do que o oferecido pela SONAE; tanto assim é que o Conselho de Administração se propõe adquirir, a curto prazo, dez por cento do capital próprio a um preço cerca de dez por cento superior ao que a SONAE oferece;

- A PT tem grande capacidade de gerar dividendos, tanto assim que já este ano distribui dividendos recorde.

Face a estes argumentos, devo dizer que as minhas interrogações são grandes. Desde logo, porque ainda há um ano a cotação das acções da PT rondava os sete euros por acção. Porque é que teve que existir uma OPA para que os condutores dos destinos da empresa "reparassem" que podiam adquirir as acções aos seus accionistas a quase doze euros por acção? Não foi seguramente porque a PT se valorizou, em termos reais e no curto espaço de um ano, nessa dimensão relativamente gigantesca.

Mas tenho uma segunda. Que raio se passou, num ano em quase crise económica como foi 2006, para que a PT tivesse lucros tão gigantescos que permitiram distribuir dividendos recorde?

Com toda a franqueza, não acredito nisto. Com toda a franqueza, creio que estamos apenas a prometer sem conhecer se se pode cumprir. Isto faz-me lembrar a vida política. Prometer para ganhar eleições. Se as ganharmos, logo se vê. Com toda a franqueza, creio que os defensores da PT estão a usar todos os estratagemas, AGORA, para se defenderem. DEPOIS, quando o temporal passar, vamos a ver, como diz o cego. É um pensamento assim que inculca o comportamento passado.

Fica a terceira interrogação. Esta não já do analista do mercado de capitais e das OPA's, mas do consumidor dos serviços da PT. Onde ela tem sido quase monopolista. Muitas vezes tratando os Clientes do modo altivo como a Companhia das Índias tratava os marinheiros. Não podemos esquecer da resistência por ela oferecida, enquanto detentora dos meios materiais necessários às comunicações, à liberalização do mercado que nos trouxe preços mais baratos. Pela minha parte, estive quase um ano à espera de ser Cliente de outro operador de rede fixa porque a PT não disponibilizava os meios, usando de todos os subterfúgios para isso. Afirmou o Presidente da PT que esta tem boa imagem no mercado de capitais. É caso para acrescentar: mas só nesse; nas telecomunicações nem por isso."

Excerto da crónica O AGORA E O DEPOIS - Magalhães Pinto - Vida Económica - 28/2/2006

2 comentários:

Anónimo disse...

Leio-o regularmente e simpatizo com a maior parte das suas opiniões acerca dos mais diversos assuntos, mas neste assunto da OPA sobre a PT, nota-se em demasia a sua proximidade com o Sr. Belmiro de Azevedo, pessoa que também admiro, mas que tem alguns “ses”.



Nos comentários que tece sobre a PT, concordo com alguns discordo com outros, mas por acaso nunca o ouvi comentar porque vendeu o Sr. Belmiro de Azevedo uma empresa “sonaecom” em OPV a 10€, quando o valor do mercado da mesma em menos de um ano passou a ser 2/3 €.



Pode-se de certa forma dizer o pequeno investidor que foi “roubado” pelo Sr. Belmiro, pois a não compreendo que uma empresa possa ser posta no mercado a um preço que seja no mínimo em consonância com a sua avaliação, na prática o que aconteceu foi que esta OPV pagou a totalidade do capital investido pelo Sr. Belmiro na “sonaecom”, isto devia ser investigado, e é por estas e por outras, que a simpatia e admiração por um empreendedor, podem ser substituídas por uma desilusão para quem só vê $$$, não olhando a meios para os obter.



Aliás o desprezo a que são votados os pequenos investidores é notório na maioria dos títulos do grupo familiar do Sr. Belmiro, é um facto, engraçado que nem com a OPA sobre a PT o titulo sonae.com chegou ao valor a que o Sr. Belmiro o vendeu aos “patos”, no qual eu me incluo.



Serviu-me de emenda, “títulos de Belmiro nunca mais”, nem dados porque o mais certo é se forem dados trazerem encargos atrás J.

MAGALHÃES PINTO disse...

Obrigado pelo comentário, meu Caro Amigo.

Em primeiro lugar, devo dizer-lhe que penso que tem evidente razão quanto ao preço a que as acções da SONAECOM foram oferecidas ao mercado pelo Grupo Sonae. Creio mesmo que, na altura, fiz um comentário público sobre isso, dizendo que se tratava de um ilegítimo aproveitamento da "bolha" então existente no mercado de capitais.

Em segundo lugar, a afirmação de que, reconhecendo o direito à defesa contra a OPA por parte dos accionistas da PT, entendo eu que empresas protegidas por blindagem de estatutos não deviam estar cotadas no mercado de capitais. Quem não quer estar sujeito às regras do mercado não deve estar nele.

E essa a grande diferença entre as duas atitudes. É verdade que o Grupo Sonae vendeu excessivamente caras ao mercado as acções da SONAECOM, mas fê-lo dentro das regras. Quem quis comprou, quem não quis não comprou. Os accionistas minoritários da PT não se defenderam dentro das regras do mercado. Controlam a empresa com um escasso investimento próprio. E impediram os pequenos accionistas de vender a bom preço as acções que detêm na empresa.