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12.1.10

MEMÓRIA

A GRANDE ILUSÃO

No seu último editorial, o Director do semanário "Expresso", Dr. José António Saraiva, escreveu uma frase lapidar. Correspondente a uma ideia que também tenho por aqui deixado, mas nunca com tão apreciável clareza, na sua simplicidade. "Portugal precisa de ganhar juízo", escreveu ele. Fôssemos nós um povo dado à reflexão e já teríamos todos chegado a essa conclusão. Mas a verdade é que não somos. E, assim, continuaremos todos a praticar as loucuras de quem se julga dono do mundo e não tem onde cair morto. Continuaremos a vegetar na ideia de que fazemos parte de uma Europa que, economica e socialmente, se encontra a anos-luz do ponto onde nos encontramos. Continuaremos todos a viver a grande ilusão de que tudo nos é possível, enquanto nos vamos afundando paulatinamente em direcção ao nada. Não quero ser pessimista e as minhas palavras ressumam pessimismo. Não quero ser aziago e só vejo azar à nossa frente. Não quero ser duro e as ideias brotam-me do pensamento mais duras que o diamente. E sem a sua fulgência.

A dissolução da Assembleia da República e a demissão do Governo. Devia ser algo simples e claro. O Senhor Presidente da República empastelou o processo. Havia razões para demitir o Governo. Não havia razões para dissolver a Assembleia. O Senhor Presidente dissolve a Assembleia e não demite o Governo. Foi necessário que este colocasse o combóio de novo nos carris. Auto-demissão. Numa atitude que é, obviamente, digna. Deixando no ar a insuportável ideia de que o Senhor Presidente da República não foi independente. E que tentou dar vantagem ao seu Partido. Portugal precisa de ganhar juízo.

O Orçamento Geral do Estado. De quem se disse cobras e lagartos. Sobretudo, que interrompia o esforço de equilíbrio orçamental anteriormente perseguido. Quase se exige a uma Assembleia da República pré-dissolvida que o aprove. Mais. Na justificação da dissolução, o Senhor Presidente afirma que deu espaço para a aprovação do Orçamento para não atrasar o aumento dos funcionários públicos. Poderia ser para não adiar investimentos urgentes. Poderia ser para permitir mais cedo o combate contra a evasão fiscal. Não. Foi para não atrasar o aumentos dos funcionários públicos. Um péssimo serviço prestado à ideia de que precisamos de ser austeros e rigorosos. Um péssimo serviço prestado à necessidade, que temos, de ganhar juízo.

O líder da (ainda) Oposição, José Sócrates, diz que a demissão do Governo foi uma birra. Diz uma, duas, três, dez vezes. Pertence àquele género de políticos do século XIX, que pensavam bastar afirmar uma toleima dez vezes para que o Povo começasse a pensar que a toleima era uma ideia ajuizada. E, além disso, é um esquecido. Em quatro meses esqueceu do papel caquético, antidemocrático, de birra autêntica, desempenhado pelo seu Partido e pelo seu então Secretário-Geral. Esqueceu-se que o seu Partido reclamou então, sem mesmo procurar disfarçar, que o Presidente assumisse uma posição conforme com as suas origens esquerdistas. E a toleima saiu-lhe, assim, desbocada, pela dita fora. Portugal precisa de ganhar juízo.

Mas não se fica por aí. Primeira grande medida do seu anunciado Governo (no caso de ganhar as eleições, obviamente): anular a decisão governamental de fazer pagar as SCUTS pelos seus utilizadores. E deixar tudo como estava. Pelos vistos, foi para dar oportunidade a alguém que, precisamente, pensa em afundar as finanças públicas que o Senhor Presidente derrubou um Governo sob o argumento de que fizera um Orçamento que conduzia a isso mesmo. Se isto não é de dar conosco em doidos, nada será. Portugal precisa de ganhar juízo.

Falta ver uma coisa. Aprovada que foi a baixa do IRS, que fará o aprendiz de feiticeiro (em matéria de finanças públicas), no caso de ser eleito? Vai manter a baixa? Vai anular a baixa? Vai baixar ainda mais? Vai aumentar os impostos? É bom que clarifique. Normalmente, até podíamos admitir que se calasse sobre o assunto. Mas depois de tudo o que disse sobre o Orçamento - que também quis que fosse aprovado, mau grado o voto contra - é necessário que assuma compromissos claros. Já basta que façam de nós tolos. Mesmo que o sejamos. Mas queremos deixar de o ser. Porque Portugal precisa de ganhar juízo.

E o combate contra a evasão fiscal? Como vai ficar a quebra parcial do sigilo bancário? Uma insidiosa ideia inunda-me o pensamento. Sempre que alguém se dispõe a combater os autênticos cancros que nos têm doentes, sucedem terramotos. Sá Carneiro e Adelino Amaro da Costa morrem quando procuravam esclarecer o "saco azul" do Fundo do Ultramar. Nunca mais se soube. Leonor Beleza é objecto da mais forte campanha anti-pessoal a que se assistiu na política portuguesa quando procura colocar alguma ordem na Saúde e implementar a utilização dos genéricos. A Saúde é (ainda) o cancro que se sabe. Este Governo é objecto da oposição empresarial quando, corajosamente, se decide pelo combate forte contra a evasão fiscal e, nesse sentido, cria as condições para a quebra parcial do sigilo bancário. E ouvem-se acusações de Jorge Sampaio ter seguido as recomendações da Banca no momento em que acaba com os benefícios fiscais às diversas contas de poupança. Para avaliarmos a importância destas contas para a Banca, basta apercebermo-nos dos rios de dinheiro que os bancos gastam, todos os anos, na publicidade desse produto. Devo, também eu, estar a ficar louco. Numa altura em que Portugal precisa de ganhar juízo.

Vamos agora para eleições. Ou ganha o Partido Socialista ou ganha o Partido Social Democrata. Com maioria absoluta ou sem ela, é o que se verá. Mas desconfio que o Povo vai correr, mais uma vez, atrás da grande ilusão. Pensando que os sacrifícios vão acabar. Não vão. Nem a nossa economia, nem a nossa sociedade, nem as nossas finanças, nem, em suma, o Estado que somos, estão em condições de terminar com os sacrifícios. Seja quem seja a ganhar, vai haver necessidade de continuar o reequilíbrio das Finanças Públicas. A retoma - como se viu no terceiro trimestre deste ano - não se compadece com o estrebuchar político. Não teremos quaisquer políticas novas antes de meados do próximo ano. Sendo certo que, então, estará executado já metade do Orçamento que, afinal, todos pareciam querer. Só que o não diziam. Isto é, qualquer alteração de políticas só produzirá efeitos lá para 2006. E, até lá, só poderemos esperar estagnação ou, mesmo, acentuação dos desequilíbrios. Na minha opinião, devemos todos exigir aos políticos que nos falem verdade na próxima campanha eleitoral. Que nos apresentem quantificados os custos das suas promessas. É muito fácil, a partir do que está feito, que no-lo digam. Só para tomar um exemplo. As SCUT de que falei acima. Mantê-las a cargo do Estado custará ao erário público mais de cem milhões de contos no próximo ano. E o Orçamento aprovado já era, pelos vistos, muito deficitário. Pois bem, que o Engº. José Sócrates nos diga onde vai buscar o dinheiro para custear a promessa. Onde vai economizá-lo ou onde vai obter os fundos adicionais. E que não nos venha com a fantasia de qua o crescimento económico vai permiti-lo. O crescimento económico vai, esse sim, sofrer negativamente com os actuais eventos políticos.

Se os políticos nos falarem verdade, talvez estejamos disponíveis para fazer os sacrifícios necessários. E será isso sinal de que, finalmente, Portugal está a ganhar juízo. Se, porventura, os meus palpites se confirmarem e Portugal continuar a não ter juízo, preferindo embarcar na barca da grande ilusão, em lugarde exigir a verdade, então seremos, em breve, apenas um grande hospício.

Magalhães Pinto, em VIDA ECONÓMICA, em 26/12/2004

1 comentário:

JOSÉ MODESTO disse...

Repto:
Queremos que Leça da Palmeira seja uma freguesia onde os seus habitantes sintam que não há melhor sitio para se viver.

Qualidade do AR
Qualidade das Águas do Mar

Pedimos a sua monitorização e que a mesma se faça de acordo com as directivas da EU, que as mesmas sejam asseguradas pelos departamentos competentes da Universidade do Porto.

Que se publique o resultado das mesmas.

Saudações Marítimas
José Modesto