(continuação)
Quando chegou a coluna de socorro, vinda de Mansoa, encontrou os homens em estado lastimoso, cansados, meio abúlicos, rostos encovados pela tensão e pelo receio de adormecer. O “Algarvio” olhava, incrédulo, para as mãos em carne viva, chaga indolor causada pela necessidade de matar para não ser morto. O Zé Grande também estava ferido. Um pedaço da cobertura da torre ou, quem sabe, um estilhaço vagabundo, abrira-lhe uma brecha profunda no couro cabeludo. Empapando-lhe os cabelos, o sangue escorrera, depois, pelo rosto abaixo, desenhando o leito de um rio linear. Mesmo junto do vértice da pálpebra esquerda, uma gota de sangue coagulara, ali ficando, qual lágrima rubra hesitante entre cair ou eternizar-se ali, petrificada. Juntaram-se os homens na parada do fortim, enquanto outros, dos vindos em socorro, montavam a guarda. Faltavam dois. Um nativo e o “Miragaia”. Percorreram o fortim. O nativo apareceu a um canto da casamata, vivo, acocorado, vidros de pavor a guarnecerem-lhe os olhos. Continuaram à procura do “Miragaia”. Encontraram-no, deitado no chão, perto da guarida onde fazia sentinela, arma ainda enclavinhada. Tinha o rosto meio desfeito por um estilhaço de morteiro. As quatro madrinhas de guerra já náo iriam esperá-lo à estação de Campanhã. No estádio das Antas, as gargantas roucas não encontraria linimento até surgir um outro “Miragaia”. A ranchada de filhos morrera com ele. E o pai haveira de desenvencilhar-se sozinho.
(continua)
Magalhães Pinto
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