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17.1.08

MEMÓRIA

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E se, porventura, não conseguem esses calar as vozes discordantes, neste Portugal onde já não existem polícias assim, pelo menos que não sejam secretas e infiltradas, descem então ao insulto soez, à agressão moral gratuita, ao amarfanhar traiçoeiro da dignidade de quem pensa e do respeito a que tem direito quem pensa. Numa visão enviesada, consideram como legítimo usar armas mil vezes mais nefandas do que aquelas pelas quais se julgam atingidos.

Senhores assim não chegam a ser senhores. São pequenos lordes assentes em púlpitos de cera, que o calor do pensamento esclarecido derreterá inexoravelmente. Na cegueira das suas ambições - ilegítimas pelos métodos usados - nunca vêem, os que procuram calar o pensamento, como vão ficando sozinhos na sala do trono. Nem mesmo quando já apenas escutam, na imensidão do palácio, a voz dos pagens que lhes devem a sopa ao fim do dia. Serão estes, os pagens, os atiradores das primeiras pedras quando o púlpito derreter. Tal como até Pedro fez com Cristo, serão estes, os pagens, os primeiros a negá-lo. Não três vezes, como o santo. Mas ficarão a jurar, até ao fim dos seus dias, nunca os terem conhecido.

Há momentos em que pensamos, profundamente, se os censores do pensamento livre merecem os nossos cuidados. Se devemos persistir em retirar-lhes a máscara. Em contribuir para fazer aparecer, na praça pública, a fealdade da sua verdadeira face. Temos momentos em que nos parece que não. Que, pequenos lordes como são, não deviam merecer sequer um segundo do nosso pensamento. Mas, aí, somos confrontados com outra razão. É que calar o nosso pensamento face aos assaltos dos que o querem calar é trair o pensamento daqueles que pensam como nós, não tendo oportunidade de o exprimir. Isso não o farei. A não ser que o respeito devido àqueles que nos lêm ou ouvem seja gravemente ferido. Aí, a dignidade exige-nos que nos calemos e deixemos os ofendidos pensarem porque é que nos calamos e na gravidade desse facto.

Excerto da crónica DIGNIDADE E RESPEITO - Magalhães Pinto - "MATOSINHOS HOJE" - 4/7/2004

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