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27.8.07

CRÓNICA DA SEMANA


Um dos direitos das pessoas é serem indemnizadas quando alguém lhes causa um prejuízo com a sua acção voluntária ou involuntária. E acontece mesmo que se os prejuízos são causados voluntariamente, quem os causa incorre em crime. As sociedade modernas e civilizadas têm neste princípio um dos seus equilíbrios mais importantes. Aliás, ainda há bem pouco tempo, o Senhor Presidente da República censurou quem tinha danificado propriedade alheia, a propósito da destruição de uma plantação de milho transgénico.
Sendo o Estado o conjunto dos cidadãos devidamente organizados numa estrutura de poder, não é possível isentá-lo daquela responsabilidade de indemnizar. O Estado actua em nome de todos os cidadãos perante cada um deles. E não é preciso estudar nas faculdades para reconhecer que, se o Estado causa um prejuízo a um qualquer cidadão, são todos os cidadãos que o estão a fazer. E, porque revestido de um poder especial perante cada um dos cidadãos, a responsabilidade do Estado é maior do que a do indivíduo. Isto é, cada um de nós só estará justamente protegido perante a força do Estado se tiver a possibilidade de, nos tribunais, exigir compensações para prejuízos causados por ele, por actuação sua negligente ou dolosa. Na falta dessa obrigação, o indivíduo fica sujeito às maiores arbitrariedades do Poder, sem que este tenha nada a temer.
Pois bem. Reconhecendo isso, os deputados da Assembleia da República aprovaram uma lei para regular a responsabilidade civil do Estado pelos seus actos e decisões. Bem hajam por isso. Ao fazê-lo, os deputados estavam a honrar a Democracia e a dar aos cidadãos um instrumento de defesa imprescindível perante o Poder arbitrário do Estado. E, como todas as leis, esta tinha que ser promulgada pelo Senhor Presidente da República. O qual, numa atitude irreconhecível, a vetou e devolveu ao Parlamento. Não hesito em classificar de iníqua esta decisão do Presidente da República, ele, que jurou defender a Constituição Portuguesa na qual o direito dos cidadãos à Justiça está consagrado.
Para cúmulo desta decisão inaudita e inaceitável do Presidente da República, são usados dois argumentos disparatados. “Que são todos os contribuintes que pagam as indemnizações em que o Estado incorra” é uma delas. Isto é, para Cavaco Silva deve ser um só cidadão a suportar os prejuízos causados injustamente pelo Estado, isto é, por todos os outros cidadãos. “E isto ia entupir os tribunais com processos” é o outro argumento. Isto é, e também para ele, que se lixe a Justiça desde que os tribunais funcionem. Mas se não há Justiça para que são precisos os tribunais?
Resta uma esperança. Que os deputados por nós eleitos honrem o nosso voto, aprovando de novo o diploma legal e forçando o Presidente da República a promulgá-lo.

Crónica IRRECONHECÍVEL - Magalhães Pinto - "MATOSINHOS HOJE" - 28/8/2007

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