(continuação)
Quando “ O Príncipe” foi escrito, andavam os Portugueses, nas suas caravelas e naus, a descobrir e a dominar novas terras por esse mundo fora, apenas mal intuídas pelos europeus. Mas de pouco lhes valeu a obra. Quase cinco séculos mais tarde, envolver-se-ão aí, em duras guerras, durante quase década e meia. Não tinha chegado meio milénio para conquistar a alma das gentes encontradas pelas Descobertas. Nessas guerras, sacrificou-se uma geração inteira, em nome de um conceito de Pátria que, por mais defeituoso fosse, continha os ingredientes essenciais de qualquer conceito de Pátria: amor ao território, amor às gentes, amor à língua, amor às tradições, veneração dos antepassados e da sua obra.
Para o esforço desse mais de um milhão de Portugueses passado por África nas guerras coloniais, não importa se o tempo, neste canto da Europa, era de ditadura ou democracia. O que verdadeiramente deve estar em perspectiva é o seu denodado sacrifício. Levado a cabo do jeito sempre usado pelos Portugueses. Com benevolência, com compreensão. Ainda nessas guerras esteve presente o espírito produtor da miscigenação. Os soldados portugueses demandantes de África na segunda metade do Século XX tiveram, com as populações nativas, de um modo geral, um comportamento nada condizente com um ambiente de guerra. Houve mortos, feridos, estropiados, é verdade. De parte a parte. Houve, aqui e além, uma atrocidade, é verdade. De parte a parte. Mas, escoados os primeiros momentos de terror e pânico, quando as atrocidades foram mais visíveis, não foi esse o tom geral da guerra. Esteve sempre presente, pelo menos entre os soldados – hoje ditos de ocupação e, então, de defesa – e as populações civis um clima de fraternidade. Sem prejuízo de uma ou outra excepção - isso mesmo, excepção - apenas os guerrilheiros eram tratados com alguma impiedade, sobretudo durante interrogatórios de guerra. Mas, mesmo assim, sempre procuraram os militares portugueses “recuperar” os prisioneiros. Muitos deles, depois de se terem batido no mato contra os brancos – o racismo, quando existia, tinha dois sentidos – perderam posteriormente a sua vida ou a sua integridade física nas milícias que, ao lado daqueles, combatiam os guerrilheiros da independência.
(continua)
Magalhães Pinto
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