(continuação)
Nessa tarde, António Soveral ficou a conhecer o bizarro sentido de comando do Governo. Não fora longa a sua entrevista. Perfilado ante o Ministro, quase não tivera tempo de dizer ao que ia. Se é que era necessário. Quase não era preciso dizer nada para que o Governo soubesse tudo. Um breve diálogo sobre a situação militar em Angola, a pior das províncias, a verificação de também ter começado a haver problemas na Guiné. Amílcar Cabral parecia ter desistido da via negocial, que sempre defendera. E tinham-se verificado os primeiros incidentes de sublevação. Não. Nada parecido com a greve do Pidgiguiti, alguns anos antes, por aumento de salários, então severamente reprimida. A referência ao incidente permitira, aliás, ao Ministro tecer algumas considerações sobre a necessidade de não ceder em nenhum aspecto. O estrito dever do Governo, mais do que nunca, era mostrar-se forte. A situação nas províncias ultramarinas poderia deteriorar-se rapidamente se a resposta não fosse firme. Era necessário mostrar, não só aos autóctones mas também ao estrangeiro, que Portugal não iria ceder. Depois de muitos anos de descanso, o Exército Português era, de novo, chamado a defender a integridade territorial. Ventos da História era uma expressão de circunstância, usada pelos comunistas para justificar a acção tendente a colocar na esfera de influência soviética os ricos territórios portugueses do Ultramar. O tempo mostraria estar a razão do lado de Portugal. Fora aquela necessidade de firmeza a forçar o Governo ao levantamento de autos a todos os oficiais do quadro que se tinham rendido na Índia. Mas estivesse o senhor Tenente-Coronel descansado. O seu filho brevemente estaria em casa. Finalmente. António Soveral agradeceu. Com altivez, que um fidalgo não se curva senão perante o rei. Fez a continência da ordem, com um ruído bem audível dos tacões a baterem. Deixou o Ministério e dirigiu-se ao quartel. Embora sentisse que devia dar a boa nova à mulher, o conhecimento tido do regime não o deixava cantar vitória ainda. E o seu instinto de protecção da família aconselhava-o a preservar Maria Amélia de esperanças falíveis. Melhor seria esperar a libertação do filho.
(continua)
Magalhães Pinto
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