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20.11.07

OS HEROIS E O MEDO - 90º. fascículo

(continuação)

De repente, a guerra, tornada longínqua e alheia pelos quase seis meses de espera, era agora real, palpável, própria. Já não há mais nada entre nós e a guerra, a não ser uma viagem, meus companheiros. Ninguém está formado com arma, mas quase posso sentir o cano da G3 nos meus dedos. Estou a ver o medo esculpido nos olhos de todos vós. Um medo de certeza igual ao meu. Guiné. Quase não me lembro do que aprendi na primária sobre a Guiné. Gostava de voltar lá, aos bancos da escola, agora mesmo, para reaprender tudo. É Bissau, não é, a capital? Espera... Lembro-me agora de um nome ao qual achava piada. Bichagós ou Bijagós, já não sei bem. Só não me lembro se é uma raça ou um fruto. Talvez umas ilhas. Há muitas ilhas na Guiné. Ainda vão ser mais, companheiros. Quando as balas sibilarem ao nosso ouvido, segredando a morte, cada um de nós vai ser uma ilha. Submersa ou não, logo se verá. Vai depender da tempestade. Ei!... Que diz ele?... Ah!... Dez dias de licença para estar com a família. As últimas horas são para estar com a família. Assim, já não se pode dizer que a leva dos filhos, dos maridos, dos amantes, é um assalto repentino à mão armada. Assim, é um desvio feito paulatinamente, aos pedacinhos. Não há dúvida. Eles sabem fazer as coisas.

(continua)

Magalhães Pinto

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