ANEDOTA
Juro que esta história é verdadeira e não uma anedota apanhada na Internet. Um amigo meu precisou de passar uma procuração. Bom cidadão, arrimou-se ao computador, digitou-a, imprimiu-a em papel branco imaculado e, sem assinar, dirigiu-se a um notário da nossa terra. Quando atendido, preparou-se para assinar na frente do funcionário, para que o reconhecimento pudesse ser presencial. Nesse momento, o funcionário esclareceu-o:
- Quer que reconheça assim dactilografado - custa trinta euros - ou quer passar a procuração à mão - e o reconhecimento custa-lhe só dezasseis euros?…
Palavras para quê? Este é o Portugal profundo, ainda na idade média. Este é o Portugal do choque tecnológico. Este é o Portugal do TGV. Este é o Portugal do aeroporto espacial. Este é o Portugal dos metros a centímetro. Este é o Portugal que nos doaram e que, por receio de estragá-lo, mantemos no tempo dos nossos tetravós. Por isso é que o vetusto Doutor Mário Soares tem algumas ténues possibilidades de ser reeleito.
O meu amigo, pacientemente, lá gastou alguns minutos a escrever a procuração à mão, num papel pelo menos tão imaculadamente branco como o outro, poupando assim catorze euros. Só perdeu verdadeiramente a paciência quando, pedindo o respectivo recibo, o funcionário o invectivou, dizendo:
- Recibo?… Para quê?… Não lhe serve para nada!…
Mas não acabou aqui. O meu amigo reparou que o seu bilhete de identidade estava quase a caducar. Como não temos Loja do Cidadão em Matosinhos, apesar de todas as promessas que nos fizeram, dirigiu-se à dita do Porto. Depois de preenchidos os impressos e entregues, perguntou quando estaria pronto. Disseram-lhe que seria daí por trinta dias. O meu amigo admirou-se por ser tanto tempo. Afinal, andam para aí a anunciar empresas constituídas no mesmo dia e o seu bilhete de identidade demorava trinta? A resposta que recebeu quase o ia enviando para o Hospital Conde Ferreira:
- É… é que tem que ir a Matosinhos… se o senhor morasse no Porto, eram só cinco dias…
O meu amigo percebeu bem, então, a grandeza da Estrada da Circunvalação. São precisos, pelo menos, vinte e cinco dias para atravessá-la e voltar. E percebeu também que entre a propaganda dos responsáveis e a triste realidade vai uma distância maior do que o comprimento do Metro do Porto, que o nosso Vereador do Ambiente tão empenhadamente anda a realizar. Muito provavelmente, é porque o dinheiro do Estado não dá para tudo. Nem o da Câmara. Se não acreditam, perguntem.
Magalhães Pinto, em MATOSINHOS HOJE, em 7/8/2005
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