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18.1.07

LÍNGUA PÁTRIA

Pelo interesse de que se reveste, publicamos uma mensagem que nos foi enviada por glerae@ip.pt:

***

Desde que os americanos se lembraram de começar a chamar
"afro-americanos" aos pretos, com vista a acabar com as raças por via
gramatical - isto tem sido um fartote pegado! As criadas dos anos 70 passaram a
"empregadas" e preparam-se agora para receber menção de "auxiliares de apoio
doméstico".
De igual modo, extinguiram-se nas escolas os "contínuos";
passaram todos a "auxiliares da acção educativa".
Os vendedores de medicamentos, inchados de prosápia,
tratam-se de "delegados de informação médica". E pelo mesmo processo
transmudaram-se OS caixeiros-viajantes em "técnicos de vendas".

Os drogados transformaram-se em "toxicodependentes" (como se
os consumos de cerveja e de cocaína se equivalessem!); o aborto eufemizou-se em
"interrupção voluntária da gravidez"; os gangues étnicos são "grupos de
jovens"; os operários fizeram-se de repente "colaboradores"; e as fábricas,
essas, vistas de dentro são "unidades produtivas" e vistas da estranja são
"centros de decisão nacionais".

O analfabetismo desapareceu da crosta portuguesa, cedendo o
passo à "iliteracia" galopante. Desapareceram outrossim dos comboios as
classes 1.ª e 2.ª, para não ferir a susceptibilidade social das massas
hierarquizadas, mas por imperscrutáveis necessidades de tesouraria continuam a
cobrar-se preços distintos nas classes "Conforto" e "Turística".

A Ágata, rainha do pimba, cantava chorosa: «Sou mãe
solteira...» ; agora, se quiser acompanhar os novos tempos, deve alterar a
letra da pungente melodia: «Tenho uma família monoparental...» - eis o novo
verso da cançoneta, se quiser fazer jus à modernidade impante.

Aquietadas pela televisão, já se não vêem por aí aos
pinotes crianças irrequietas e «terroristas»; diz-se modernamente que têm
um "comportamento disfuncional hiperactivo". Do mesmo modo, e para felicidade
dos "encarregados de educação", os brilhantes programas escolares extinguiram
Os alunos cábulas; tais estudantes serão, quando muito, "crianças de
desenvolvimento instável".

Ainda há cegos, infelizmente, como nota na sua crónica o
Eurico. Mas como a palavra fosse considerada desagradável e até aviltante,
quem não vê é considerado "invisual". (O termo é gramaticalmente
impróprio, como impróprio seria chamar inauditivos aos surdos - mas o
"politicamente correcto" marimba-se para as regras gramaticais...)

Para compor o ramalhete e se darem ares, as gentes cultas da
praça desbocam-se em "implementações", "posturas pró-activas",
"políticas fracturantes" e outros barbarismos da linguagem.

E assim linguajamos o Português, vagueando perdidos entre a
«correcção política» e o novo-riquismo linguístico.

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