O PROCESSO DE DECISÃÕ
(continuação de 29/12/2006, 3/1 e 5/1/2007)
A decisão de casar é uma das mais difíceis. Porque as alternativas são praticamente infinitas, porque a informação disponível é geralmente escassa, porque a decisão vai encadear-se com as decisões de outros decisores, porque os efeitos da decisão prolongar-se-ão pelo futuro fora até perder de vista. Aliás, isto acontece com muitas decisões. Nem todas são tão simples quanto decidir comer castanhas.
E este é um pormenor que, de modo algum, deve ser desprezado. O encadeamento das decisões que tomamos com as decisões que os outros tomam. Não sei se as senhoras sabem aquilo que impropriamente se diz jogar xadrez. Impropriamente chamado jogo, porque lhe falta uma característica essencial do jogo, que é a influência da sorte. É uma actividade lúdica fascinante porque, no encadeamento das decisões dos dois oponentes, o número de combinações possíveis, para movimentar trinta e duas peças em sessenta e quatro casas do tabuleiro, é infinito. Agora vejam quanto mais fascinante é o tabuleiro da Vida, com um número infinito de peças e de casas. Sendo que uma das peças somos nós próprios. O objectivo do xadrez é o xeque-mate. O objectivo da Vida é o xeque viva. Se possível feliz. O que quer dizer, atingindo os objectivos a que se propõe. Tal como no xadrez, é necessário ter em conta os movimentos de todas as peças que se encontram presentes no tabuleiro, para melhor se conseguir o objectivo.
Esta comparação com o xadrez traz ainda à superfície um aspecto essencial do processo de decisão. É que um processo de decisão é ele próprio um encadeado de decisões menores. Voltemos ao nosso exemplo das castanhas. Vou na rua. Vejo o castanheiro. As castanhas. Estão apetitosas. Pergunto o preço. Penso fugazmente, se penso, se no castanheiro lá mais adiante não serão as castanhas melhores e mais baratas. Decido comprar as castanhas. Para as comer, meu objectivo final, ainda falta muito. Decido ir ao bolso buscar o dinheiro. Pago. Recebo as castanhas. Estão muito quentes. Decido aguardar um pouco, para arrefecerem um nada. Decido descascá-las. Decido deitar as cascas no chão ou no contentor de papéis. Decido levá-las á boca. Decido mastigá-las. Decido enguli-las. E então posso dizer que concluí o processo. Isto é, que atingi o fim a que me propuz, quando decidi comer castanhas. Só espero que com esta complicação, as senhoras não decidam daqui para o futuro só comer castanhas peladas, para o que o número de decisões intercalares é muito menor. É que não sabe tão bem!
(continua)
Conferência O PROCESSO DE DECISÃO - Magalhães Pinto - Vila Real - Novembro de 1993
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