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28.6.07

A DUVIDA - 108º. fascículo

(continuação)

Decidi-me, já a noite tinha avançado. No dia seguinte iria percorrer todos os apartamentos daquele prédio, de fotografia na mão, perguntando por Maria do Céu. Alguém havia de conhecê-la. Se não encontrasse nenhuma explicação pelos meus próprios meios, enfrentá-la-ia. Com a consciência pesada pelos actos de deslealdade cometidos. Com a atenuante da inexistência duma explicação. Algo mais tranquilo, por ter encontrado um modo de apaziguar, nem que fosse por uma noite, o meu estado de espírito. Arrumei os papéis sem despacho, apaguei a luz e fui para casa.

Maria do Céu estava já na cama. Ou não dormia ainda ou acordou, quando entrei. Felizmente, andava pouco faladora. Não me apetecia conversar.


XX

O dia seguinte foi uma via sacra. Dezassete andares, a seis apartamentos por andar. Via sacra de um crucificado no seu calvário. Por uma informação. Bati à porta de todos. Menos um, o da Dona Néné, no qual não bati, naturalmente. Alguns permaneceram irritantemente silenciosos face ao meu apelo. Ou desabitados ou de locatários ausentes. De cada vez que não obtinha senão o silêncio como resposta, não evitava a lembrança de poder ter sido naquele que Maria do Céu estivera. Esmiuçava a porta, os tapetes, quando existiam, na tentativa de ver algum sinal de movimento recente. Tinha a sensação de estar a mergulhar num lodaçal sem fundo, areias movediças por mim inventadas para nelas soçobrar. E se eu chegasse ao fim daquela pesquisa sem ter localizado o destino de Maria do Céu quando entrara naquele edifício? E se o Marques tivesse confundido qualquer outra mulher com Maria do Céu? E se o Marques me tivesse mentido, como eu chegara a desejar? E se... O meu pensamento era um grande se, quase só com reticências por acompanhamento...

(continua)
Magalhães Pinto

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