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29.7.07

A DUVIDA - 138º. fascículo

(continuação)

Passados uns três minutos, Maria do Céu tinha adormecido. Entrou no gabinete um médico, acompanhado duma enfermeira. Nem saudaram. Enfiou um par de luvas de borracha, gestos decididos de quem sabe o que vai fazer e quer fazê-lo depressa. A enfermeira descobriu Maria do Céu, sacando a toalha e atirando-a para um cesto. Agarrou-lhe nos pés e assentou-os no repouso obstétrico, escachando as pernas. O cenário ganhou um tom obsceno, com os orgãos genitais de Maria do Céu expostos daquele modo. Eu quase tinha receio de respirar, subjugado pelo espectáculo inusitado, esperando ver dali surgir, a qualquer momento, a cabeça do Miguel. O médico aproximou-se, ladeado pela enfermeira. Nas mãos desta, uma bandeja, na qual se alinhavam vários instrumentos brilhantemente cromados, como carros de assalto à espera do início do desfile.

Perdi a noção do tempo. Hirto, olhava os gestos mecânicos do médico, firmes sem serem bruscos, como se se tratasse da passagem dum filme em câmara lenta. Introduziu o dedo médio da mão direita na vagina de Maria do CŽu, para uma apalpação. Pediu o espéculo à enfermeira, ajustou-o e começou a abri-lo, falo monstruoso de metal em erecção bizarra. Procurou o focinho de tenca uterino e localizou a porta do canal cervical. Pediu laminárias à enfermeira. Um número que não entendi. Esta deu-lhe a mais fina. Com algum cuidado, introduziu-a no útero de Maria do CŽu. Aguardou um pouco. Retirou-a. Pediu outra. Mais grossa. Outra. Outra ainda. Sempre mais grossas. Cópula monstruosa em ritmo de paquiderme. As laminárias saíam do útero mais grossas do que haviam entrado. Inchavam lá dentro, como se lhe quisessem rebentar as entranhas. Aspirador. A enfermeira chegou-lhe um pequeno aparelho de ponta fina, com um motor eléctrico já a funcionar, num ruidoso orgasmo invertido. Gulosa, a máquina sugou tudo o que encontrou no seu caminho. O médico lavou tudo com um líquido antisséptico. Retirou o espéculo. Pronto... Levem-na para a sala de recuperação e façam entrar a próxima... Linha de desmontagem de vidas embrionárias. Em plena actividade. A racionalização da produção também tinha chegado à sua destruição. Acompanhei a padiola rolante na qual Maria do CŽu foi transportada para um pequeno cubículo, onde apenas cabíamos os dois.

(continua)

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