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20.7.07

A DÚVIDA - 129º. fascículo

(continuação)

Aquele grito, quase um urro de animal pré-histórico ferido, que me ouviste, Maria do Céu, continha todo o desespero da Humanidade. Foi como se o universo inteiro se tivesse desagregado dentro de mim e os pedaços, não encontrando outra saída senão o gargalo estreito da minha garganta estrangulada, rebentassem tudo na sua passagem. Desfazendo, à minha frente, o que restava de ti. Transformando-te numa massa sanguinolenta. Olhava a tua expressão assustada e não a via- Só via uma criança, corpo minúsculo com o rosto do Miguel, a tentar libertar-se dessa massa. cada vez mais pastosa. Felizmente, desaguei naquele choro convulso, incapaz de sustentar a tensão.

Por largo tempo, ficámos sentados, cabeças escondidas nas mãos enclavinhadas, como se a vergonha de todos os erros humanos residisse em nós. Por várias vezes, comecei a falar, sem ir além das primeiras sílabas. A Vida, o destino, deus ou semelhante, presenteava a minha companheira com a criança que eu tanto desejara. E tudo quanto tinha para lhe dizer era que fizesse um desmancho. Numa atitude a mim mesmo explicada como corajosa.

(continua)
Magalhães Pinto

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