(continuação)
Fiquei largo tempo a observar a sua beleza, apenas vestida pela tranquilidade do sono. E tentei prescrutar os mistérios insondáveis que faziam dela uma mulher única. Onde as outras mentiam, ela falava verdade. Onde as outras fingiam um prazer inexistente, ela assumia a impossibilidade de o atingir. Incongruente entre o ser e o estar. Dir-se-ia sacando a alma do corpo antes de prevertida, esfarrapada, destruída, pela profissão escolhida.
Apaguei a luz, congeminando um plano que me levasse a conhecê-la. E adormeci também. Quando acordei, já não estava junto a mim. Corri ao quarto de banho, à sua procura, em vão. Havia saído sem eu dar conta. Não recebera o tratado. Senti-me ofendido. Não precisava dos favores duma prostituta. Quem pensava ela que eu era? Algum proxeneta ou quê? Mas ao barbear-me, na difusa imagem reflectida pelo vapor de água quente depositado no espelho, sobressaíam dois olhos lindos, não obstante a opacidade que os vestia. Não eram meus.
(continua)
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