(continuação)
O teu gesto de fragilidade, de temor quase infantil, Maria do Céu, quando subimos ao cume da Torre Eiffel, fez-me sentir senhor do mundo. Ali estavas, transportada, pela minha mão, mais alto do que jamais estiveras, tendo aos teus pés a cidade mais bonita do mundo, como se a dominasses. E, subitamente, como se temesses toda aquela grandeza, era eu, era o meu braço, o esteio no qual buscavas o equilíbrio, a segurança. Não resisti aos sinos a badalar dentro de mim. Abracei-te. Procurei os teus lábios com os meus. Ainda tenho, na boca, o sabor salgado da adrenalina que em nós correu à desfilada, nesse momento de emoção.
Almoçámos umas coxas de frango no restaurante do primeiro andar da Torre. Saimos. Queria agora levar Maria do Céu à Pigalle. Entre o receio de provocar qualquer desagrado em Maria do Céu e a curiosidade de ver como ela reagia, mandava a segunda. Continuava a apostar na terapêutica do choque, do confronto, convencido de que só quando ela fosse capaz de enfrentar a lembrança do passado sem tremer, sem vacilar, estaria definitivamente curada. Como o ferido de guerra, que apenas bem cuida da sua protecção depois de muito ouvir de novo as balas em seu redor. Mas não queria forçar demasiado. Preferia mostrar-lhe a Pigalle à tarde. À noite as reminiscências da sua vida passada seriam muitas.
(continua)
Magalhães Pinto
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