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18.5.07

MEMORIA


A ser verdade o que os jornais noticiam, voltámos a ser objecto de uma tentativa de invasão espanhola. Desta vez, em lugar de cavaleiros e canhões, como em Aljubarrota, a tentativa castelhana veio por mar, disfarçada num petroleiro escanzelado, a verter lixo negro por um buraco medonho. Temos de convir que o ardil estava bem pensado. Temos aí, pelas nossas costas, tantos barcos espanhóis a capturar, livremente, os nossos recursos piscícolas, que mais barco menos barco pouco importaria aos Portugueses, terão pensado eles.

Julgo que cometeram dois erros monumentais. Em primeiro lugar, não contaram com a nossa tradicional esperteza. Um desleixo incrível dos nossos vizinhos, que já deveriam conhecê-la desde o famoso quadrado do Condestável Nuno. E, em segundo lugar, bem mal andariam se pensavam que era com lixo que nos conquistavam. É bom que saibam que estamos habituados a ele e que não é por aí que colocam um novo Filipe no nosso trono!

Felizmente, a nossa marinha estava atenta. E ali, mais ou menos em frente a Caminha, deu gosto ver um caíque nosso a postar-se à frente do gigantesco mastodonte do petróleo, com os marujos a gritar: não passarão! Rabito entre as pernas, o gigante dos mares não teve outro remédio. Regressou a penates. Com o desgosto da derrota, rezam as crónicas, também, não ter tido coragem para enfrentar o rei da Galiza. E preferiu morrer afogado. Não sem antes ter despejado grande parte do lixo no mar, o qual está agora a submergir todas as fragas e praias da agradável região vizinha. Especialmente, todas as fragas. Ou me engano muito, ou até uma, mais conhecida Iribarne, vai ser submergida.

Aqueles que se recordam do barulho que fiz, aqui, contra a paixão assolapada que em tempos existiu entre o rei da Galiza, Iribarne, e o vice-rei do Norte, Fernando Gomes, que meteu abraços, beijinhos, e a que só faltou a aliança do casamento no dedo, vêm agora como eu tinha razão. Bom é de ver quem, nessa história, fez o papel de Miguel de Vasconcelos.

Ainda estavam mal refeitos da nossa heróica resistência os castelhanos, quando demos o contragolpe. Um general português, de seu nome Francisco Louçã, invadiu o país vizinho e, com uma coragem inaudita, desferiu, nas praias da Galiza e sem misericórdia, bordoadas a torto e a direito. A direito, não. À direita. Dizem que a Esquerda galega agradece. E que a alegria nas hostes minhotas portuguesas foi enorme, ajudada pelo vento favorável. Uma alegria que compartilho.

Mas há, nesta guerra, algumas coisas que me entristecem. Em primeiro lugar, estou convencido que o dito general Louçã – que vociferou contra a presença do Chefe de Governo espanhol no Congresso do PSD – faria um barulho dos diabos no Parlamento se algum castelhano viesse por aí gritar contra a nossa inacção na protecção ao ambiente. E, nestas coisas, tem que haver lealdade. Não devemos fazer aos outros o que não queremos que nos façam a nós. Em segundo lugar, confrange-me ver que os meus compatriotas não percebem que o sucedido é um crime contra a Humanidade, da qual também fazemos parte. E que os espanhóis têm tanto a ver com isso como nós. Em boa verdade, devíamos estar todos a ajudar os Galegos a limpar as praias e a minimizar os custos deste trágico acontecimento do qual não tiveram culpa. Custos que, quer queiramos quer não, com ventos favoráveis ou desfavoráveis, nos vão bater na cabeça também.

Crónica AS ARMAS E OS VARÕES - Magalhães Pinto - "Matosinhos Hoje" - 24/11/2002

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