(continua)
Desde muito nova, Rafaela habituara-se a gostar de si mesma. Quase tanto quanto detestava quem lhe não satisfazia as vontades. Aprendera a gostar do seu corpo. Um corpo primeiro rechonchudo, depois escanzelado e, por fim, suavemente arredondado, quanto baste para atrair os olhares desejosos de machos a despertar. Descobrira por si mesma os prazeres da carne. Aí pelos doze anos. Numa tarde de verão, na quinta de Soveral. Em plenas férias. Calor a rebentar com as folhas mais sequiosas das vides e a puxar pela natureza ainda virgem. Buganvílias em plena floração, num apelo ao acasalamento dos insectos com os estames. A mãe fora à vila. Os criados, pelo menos aqueles que não aproveitaram da falta de vigilância para uma sesta apetitosa, amanhavam a terra lá no vale. Na casa, um solar de granito com brasão esculpido por sobre o portal da entrada, apenas os dois irmãos, cada qual em seu quarto. Rafaela depressa se enfadou do brinquedo preferido, os seus cabelos, ata que desata, penteia que desfaz, risca ao meio risca ao lado. E resolveu ir em busca de emoções para outras paragens, quem sabe lá em baixo, junto aos criados. No corredor, em frente do quarto do irmão, parou. Tão grande silêncio era estranho. Quase toda a tarde o ouvira a dedilhar desafinadamente as cordas dum violão trazido do Colégio, parece que emprestado por um camarada de estudos. Com pés de almofada, aproximou-se da porta e espreitou pelo buraco da fechadura, há muito sem chave. Ficou imóvel, fascinada com o que via. O irmão estava deitado em cima da cama. A fechadura não a deixava ver, do irmão, mais do que da cintura para baixo. Tinha as calças e as cuecas descidas até meio das coxas. A princípio não percebera bem aquilo a que assistia. Mas quando a respiração ofegante do irmão se acelerara, tornando-se audível, teve a vaga intuição da realidade. Os surdos gemidos do irmão não eram de dor. Regressara ao quarto. Meditara naquilo. Baixara as cuecas, e começara a acariciar-se, a ver se produzia fenómeno idêntico. Sentira qualquer coisa endurecer. E dava-lhe prazer mexer naquilo. Continuou, à medida que um calor delicioso lhe invadira as entranhas, num crescendo que terminou numa explosão feita de estrelas e cores, da qual emergia um falo enorme, encabeçado pelo rosto do irmão.
(continua)
Magalhães Pinto
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