(continuação)
XI
O Hotel Finistère, na Rua dos Estados Unidos, era um hotel simpático, embora modesto. A dona e gerente, uma loira já bem entrada nos cinquenta, mas ainda com charme suficiente para acordar os desejos mais serôdios de alguém à procura de emoções, foi extremamente gentil. Apercebeu-se de que não éramos gente endinheirada e disponibilizou-nos um quarto sem banho, lá no último andar. Mas acrescentou que, mesmo ao lado da porta do quarto, havia uma casa de banho comum reservada ao nosso uso exclusivo. Uma gentileza possível pela reduzida ocupação do hotel nas épocas próximas do natal. A rua era calma, sem trânsito. Iríamos poder dormir bem. O tráfego, relativamente intenso, do Boulevard des Mallesherbes, escoava-se, praticamente todo, ali junto da Madeleine, ao fundo da rua, em direcção à Concorde. E só se desviava para a Rua dos Estados Unidos quem a tinha mesmo por destino.
Levámos as malas escada acima durante três andares e encontrámos o quarto ao fundo do corredor. Entrámos. Um cheiro a lavado e o habitual conforto francês acolheu-nos. Maria do Céu estranhou a ausência de cobertores na cama. Parecia só ter lençóis. Expliquei-lhe que aquele lençol de cima, dobrado aos pés da cama, era muito mais quente que o melhor cobertor da serra que houvesse lá em Rala. Arrependi-me logo da referência, a ensombrar o seu semblante. Em cima da cómoda, antiga mas envernizada a preceito, uma jarra com flores, rosas. Estes franceses, disse eu, em voz alta... Fazem das flores uma companhia de todas as horas. Mas hoje não preciso de flores. Tu és a minha flor preferida. Petite fleur, acrescentei, numa alusão a um trecho musical muito em voga. Pousei as malas em cima da cama, voltei-me para Maria do Céu, a mirar-se no espelho de corpo inteiro, enquanto em vão tentava alisar a saia preta, enrugada da viagem. O nosso olhar cruzou-se, num sorriso cúmplice, provavelmente determinado pela sensação estranha que o facto de, pela primeira vez, estarmos numa situação de normalidade para um casal de lei, nos provocava. Aproximei-me. Enlacei-a pela cintura com uma mão, enquanto na concha da outra, guardei um seio, acariciando-lhe suavemente o mamilo meio adormecido, com a ponta do indicador. Senti a resposta traduzida na protuberância da blusa. Fechou os olhos por instantes. Libertou-se, num gesto súbito, e dirigiu-se para a janela. Abriu-a. Fui atrás dela.
(continua)
Magalhães Pinto
Sem comentários:
Enviar um comentário