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3.5.07

MEMORIA


"A Justiça é importante para toda a sociedade, mas que funcione mal é especialmente prejudicial para as empresas, porque lhes impõe custos muito gravosos. Está comprovado que os investimentos num país diminuem quando há insegurança jurídica. Em Espanha temos alguns problemas com a Justiça. É lenta, cara, pouco eficaz e com graves ineficiências. E isso afecta a todos os cidadãos e as empresas de um modo particular."

Prof. Santos Pastor
Catedrático de Economia Aplicada da Universidade
Complutense de Madrid, Presidente do Colégio do Instituto
de Empresa e Centro de Investigações em Direito e Economia.


A citação acima, que colhi de um periódico do país vizinho, traz a autoridade de quem se dedica a estes estudos com seriedade, numa das mais prestigiadas universidades europeias. Ao fazer uma afirmação tal, o Professor Santos Pastor apenas diz algo que sentimos todos os dias, mas a que não parecemos dar o devido relevo. E veja-se que a afirmação feita diz respeito ao país vizinho, no qual, apesar de tudo, a Justiça parece funcionar bastante melhor do que no nosso país. Imagine-se, pois, a importância dos custos ocultos do funcionamento da nossa economia, exclusivamente devidos ao mau funcionamento da Justiça.

Nos últimos tempos, a Justiça portuguesa tem estado sob a lupa dos cidadãos. Infelizmente, pelos piores motivos. E eu não sou excepção. De repente, dou por mim a pensar no país que seríamos se os nossos políticos, há tanto tempo perdidos nas suas tricas cujo objectivo único parece ser a conquista e usufruto do Poder, tivessem aproveitado o tempo assim perdido na reforma das nossas instituições. De que a Justiça é um dos pilares básicos. Além dos inconvenientes anotados pelo Professor Santos Pastor para a Justiça vizinha, a nossa ainda enferma de uma insuportável lentidão e de uma complexidade absolutamente incompreensível, que nos tornam, em quase todos os casos, numa patética imitação de país desenvolvido.

Além dos custos insuportáveis que o mau funcionamento das instituições provoca, os quais afastam do nosso país, inexoravelmente, os projectos de investimento internacional realmente sérios, tal situação tem o condão de chamar ao nosso país os investimentos pouco sérios, os quais sempre procuram as economias onde possam usar das suas artimanhas e apenas enquanto possam usá-las. Por isso mesmo é que não pode causar grande admiração a grande rotação de projectos no nosso país. Vêm, instalam-se, exploram as condições precárioas existentes e vão-se. Num quadro de grande insegurança e desorganização, nenhum projecto vem para ficar. A não ser que lhes sejam oferecidas grandes vantagens, normalmente no plano fiscal ou de incentivo financeiro. O que acaba por consituir-se como mais custos ocultos de extrema gravidade para o nosso desenvolvimento. Não apenas pelo que pagamos pela instalação dos projectos internacionais, mas também pelas condições de concorrência desleal que tal acaba por significar para as empresas portuguesas. As quais, naturalmente, não beneficiam das mesmas condições vantajosas.

Se realmente nos interessamos pelo futuro da nossa sociedade, facilmente chegaremos à conclusão de que isto não pode continuar assim. Uma frase que quase todos os dias nos sai da boca, mas que é mais um desabafo de impotência do que um propósito de emenda. É necessário que transformemos o desabafo em atitude consistente. Temos que perceber que, em última instância, é a todos nós que cabe a responsabilidade pelo estado a que chegamos. Porque vimos curto, porque falamos em lugar de agir, porque abandonamos os políticos à sua boa-vontade, a qual, porventura, não passa disso. É só boa-vontade. Temos que encontrar forças para modificar este estado das coisas.

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Excerto da crónica CUSTOS OCULTOS - Magalhães Pinto - "Vida Económica" - 6/2/2004

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