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1.6.07

POEMA DO MÊS



PINTURA

Peguei numa cor...
Pintei uma rosa...
Juntei-lhe uma outra,
muito mais formosa,
para dar à flor
tons alaranjados
que, sem disfarçar,
falassem de amor...
Com mais uns bocados
de tintas mais pálidas,
pintei borboletas
a sair das crisálidas...
E fi-las voar
sobre a minha rosa...
Luxúria no ar
disfarçando o desejo
que costuma poisar
nas flores, como um beijo...
Em tons de vermelho,
pintei, com ardor,
um sol que, já velho,
ainda tinha calor...
E ao longe, saltando,
desenhei a alegria
de criança agarrando,
para si, mais um dia....
Peguei noutro pincel
e, com todo o cuidado,
usei tons de pastel,
em traços ligeiros,
para pintar uma fonte
junto a dois ribeiros
que se encontram lá em baixo,
vizinhos dum monte...
E, mesmo por debaixo
duma árvore frondosa,
pintei um pastor,
duas cabras e um cão...
Parados... quietos...
os três numa profunda meditação,
quase religiosa,
rodeados por um tufo de abetos...
Olhei a pintura....
com certa ternura...
Parecia-me quase, quase, bem...
Mas faltava-lhe o toque final..
aquele algo que anima...
Um toque de sensibilidade
sem o qual,
qualquer habilidade
não chega a obra-prima...
De pincel na mão,
segurando a paleta,
olhava-a, parado...
E foi então
que uma borboleta
- uma borboleta de verdade -
por ali a pairar,
poisou no meu quadro
com suavidade...
Mesmo em cima do amarelo
a imitar margaridas...
Pareceu gostar...
Tanto, que ali se ficou
horas esquecidas,
asas a espadanar,
lentamente...
naquele jeito capaz
de eternizar um instante...
Levei o quadro p'ra casa.
E quando me apraz,
como se fosse um amante,
sento-me em frente, a olhar,
vendo a minha borboleta
que não é da paleta...
asa acima... asa abaixo....
Inda lá está, a voar...
Poisada numa margarida
cercada pela verdura...
... Por isso a pintura
não é minha... É da Vida...

Magalhães Pinto

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