. . . OS SINAIS DO NOSSO TEMPO, NUM REGISTO DESPRETENSIOSO, BEM HUMORADO POR VEZES E SEMPRE CRÍTICO. . .
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10.7.07
CRONICA DA SEMANA (II)
Na última semana, percorremos parte da saga de uma empresa idónea, dedicada à consultadoria de gestão e à formação, que se atreveu a acreditar que o país precisava e queria, realmente, preparar os seus jovens para um mais fácil e competente acesso a um mercado de emprego cada vez mais volátil e inacessível, recorrendo, para isso, aos fundos comunitários destinados a esse fim. Mas a saga que descrevemos nessa crónica passada estava ainda longe do fim. Devolvemos aqui a palavra à nossa fonte de informação.
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“No capítulo de rendas e alugueres de material, volta o DAFSE a dar justificações, no mínimo chocantes, ao cortar todos os custos com aluguer de retroprojectores, projectores de slides e de opacos, vídeos, televisores, etc., considerando-os material dispensável. Mais chocante, ainda, foi o corte no aluguer de 30 computadores (foram 93 formandos durante 3 meses e a frequentar 10 disciplinas), computadores que, segundo aquela instituição, poderiam ser em menos quantidade. Apesar do próprio argumento ser injustificável para qualquer tipo de formação, convém recordar que a acção se subordinava ao tema “Técnicos Administrativos com Especialização Informática”, parecendo difícil proporcionar tal especialização se fosse usado o exigido rácio de 1 computador para 10 formandos. É interessante referir que, actualmente, os computadores são quase oferecidos - e não somente a técnicos. Também outros gastos de manutenção e reparação foram cortados, com a alegação de que, mesmo avariado ou estragado, o material deve ser assim devolvido, não sendo aceite o custo com as suas reparações (?).
Apesar das salas de formação terem sido cedidas gratuitamente, o DAFSE entendeu que: sabonetes, toalhas, papel higiénico, água, luz, etc., bem como os respectivos serviços de limpeza, não seriam elegíveis, talvez subentendendo que os formadores não teriam outra obrigação senão lavarem as casas de banho diariamente após a formação e comprarem os materiais de limpeza. De igual forma, o custo com extensões, cabos e fichas eléctricas não foram aceites, não se conseguindo vislumbrar como o DAFSE consiga ligar aparelhos à corrente eléctrica.
Algumas pequenas enfermagens e respectivo material, admissível em 93 formandos durante 3 meses, também não foram aceites, pressupostamente por se entender que qualquer formando que se magoe deverá deslocar-se a pé ao hospital mais próximo. Sim, porque as deslocações em viatura própria também foram objecto de corte. Ou não fosse o argumento apresentado pelo DAFSE: “despesas não razoáveis dentro dos critérios de razoabilidade, elegibilidade e prioridade subjacentes à formação e apoio comunitário”.
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Tudo demasiado inadmissível, mais parecendo objecto de erro ou descuido de algum funcionário, a não ser que esteja zelando pela sua avaliação de desempenho. Mas o IGFSE é claro na decisão que recebemos em 5 de Junho deste ano, onde, sob a concordância do seu Presidente, informa que somos notificados para restituir 31.121,57 euros, no prazo de 30 dias, sob pena da dívida transitar para a administração fiscal, não cabendo recurso tutelar de tal decisão, embora afirmem podermos desenvolver impugnação judicial (solução durante quantos anos?), e também, neste caso, com a obrigação de prestarmos uma garantia bancária pelo total da quantia exigida (custo durante quantos anos?). E as certidões que tanto são precisas para justificar a inexistência de dívidas fiscais?
Em jeito de conclusão, julgamos ser de lembrar que sempre constituíram objectivos inerentes aos quadros comunitários de apoio, a valorização profissional nacional e sua aproximação aos padrões europeus, onde, no caso português, se têm sentido melhorias, mas sem ter atingido, ainda, performance desejável. No entanto, é lícito duvidar que tais objectivos sejam conseguidos quando a filosofia consiste em obter qualidade ao nível europeu, com a contrapartida de um apoio de 1.004$00 por formando (insignificante mesmo na década de 80/90). Agrava este pressuposto o facto de, após se ter realizado um projecto com a qualidade e em linha com os objectivos previstos, e largos anos após ter terminado, considerar-se com tranquilidade que era possível alcançar esse objectivo com 600$00 / formando e ainda vir, agora, exigir o reembolso do que foi autorizado.
Na verdade, se a nossa empresa pretendesse investir 40.804 contos num projecto do tipo e repercutisse tal valor pelos clientes interessados (pouco mais de 400 contos a cada) solicitando esse valor à banca, por 6 meses e a uma taxa de 20% (admissível na altura), tal custaria 4.100 contos, com despesas dedutíveis em IVA e juros a abater na colecta do IRC, introduzindo os padrões de qualidade que melhor entendesse e não se sujeitando a justificações de qualquer ordem. Desta forma, por se ter candidatado a um fundo comunitário, fica rotulado de carente em suportes financeiros, e, talvez, de insuficiências para o seu desenvolvimento autónomo. No entanto, ajudou Portugal a atingir um grau de realização nos apoios comunitários.
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Desde logo não renovámos a acreditação como entidade formadora que detínhamos, porquanto não quisemos pactuar com tão baixos critérios entendidos como formação profissional subsidiada. E agora? A empresa foi penalizada no IVA que não deduziu. O subsídio que recebeu foi passível de IRC. Agora a surpresa na devolução de 6.300 contos que terá, novamente, de solicitar ao banco e com juros às taxas actuais. Perdeu muito dinheiro. Teve enormes dores de cabeça. Sujeitou-se a todo um rol de opiniões públicas e a todo um conjunto de situações de dependência e – quase – servilismo. Foi talvez compensada com um “Mestrado em Gestão de Países de Terceiro Mundo”, embora com um preço também muito elevado.
Por nós, subsídios comunitários… não. Muito obrigado.”
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Sabemos quantas trapalhadas, para não lhe chamar outra coisa, aconteceram com os fundos europeus. Sabemos da necessidade de os entes públicos responsáveis pela gestão dos fundos passarem a pente fino tudo quanto lhes é apresentado, tentando evitar o nível de fraude mínimo possível. Bem hajam por isso. Mas há, nesta longa história, acontecimentos inadmissíveis. Desde logo algo que pode ser um pecado mortal: não saber separar o trigo do joio. Repare-se em todo o comportamento desta empresa. Repare-se no sucesso que a acção foi em termos de emprego. Repare-se no detalhe de apresentação de contas que não é, obviamente, o de quem quer “burlar” o Estado . Repare-se na reacção desta empresa aos acontecimentos: pura e simplesmente desistir de fazer algo com qualidade ou sem qualidade. E, sobretudo, repare-se como é que um organismo público pode negar, tanto tempo passado, os compromissos que assumiu. Isto depois de ter demonstrado, nos passos iniciais do processo, uma competência sofrível na informação propiciada aos então candidatos.
Estamos de acordo. É uma história “exemplar”. Agora, que vai haver de novo e por aí uma chuva de euros vindos da Europa, que se cuidem os candidatos à sua utilização. Que não deixem de tornar bem claros os compromissos recíprocos. Não vão, dentro de alguns anos, ver negados os pressupostos da sua actuação.
Excertos da crónica CHOQUE TECNOLÓGICO II - Magalhães Pinto - "VIDA ECONÓMICA" - 10/7/2007
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