(continuação)
Olhou o relógio. Quase uma hora da madrugada. Chegou-se ao telefone. Ao directo, que não passava pela central. Discou o número mecanicamente. Algum tempo depois, sem resposta, pousou o auscultador. A mulher tinha ido jantar com os Pestanas. Não regressara ainda. Boa gente, os Pestanas. Embora as teorias do Fernando - o Fernando Pestana era um teórico e, como teórico que era, trabalhava no Estado Maior - não o seduzissem. O Pestana era partidário da violência na repressão da desordem. Os populares em desordem eram como as moscas numa montureira: ou se desinfectava tudo com a chegada das primeiras ou depois já não se conseguiria. Para o Fernando, a polícia era demasiado branda. Não era com canhões de água que se dispersavam ajuntamentos. Era à pancada ou mesmo, se fosse preciso, com granadas lacrimogéneas. Não. Não era assim, pensava ele. De certo modo, a populaça do continente não era muito diferente da de África. A pancada conduziria a nenhures. Pelo menos, se não fosse acompanhada duma acção psico-social bem sucedida. De certo modo, era o que Salazar estava a tentar fazer. Pancada. Psico. Psico. Pancada. Entre ele e o Fernando não era possível qualquer entendimento. Discussões sem fim quando se juntavam. Inconclusivas.
(continua)
Magalhães Pinto
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